domingo, 16 de dezembro de 2012

Advento II



Verde e vermelho:  branco,  por Sergia A.



Verdes! Clama a América
Sobre vermelhos urros
Vela sua paz bélica
 


quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

O ritual

 
Luz angelical,  por Sergia A.


Em delírio elas dançam. Seu rodopio alucina. Desconfio que elas gostam de me provocar. Sentem prazer em me ver assim tonta, perdendo o fôlego para acompanhar de longe seu ritmo. Por compaixão, às vezes me chamam pra dançar. Eu deslizo no amplo salão. Às vezes acerto o passo. Às vezes vou ao chão. Sigo. É o dançar que me desperta o gosto, talvez mais que a dança que dali resulta.

Estou novamente às vésperas de um janeiro a observá-las, desejando ardentemente que me chamem para dançar. Há um ritual de transição a minha espera. Elas se negam, brincam comigo. Montam um jogo de sedução. Pra corresponder à altura recorro aos poetas, perfeitos bailarinos, perfeitos coreógrafos. Captam a essência do seu jogo. Tomam-nas pela mão dispondo-as em fino arranjo, ou talvez, em um gesto de resignação, se deixam domar.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Das inutilidades

 
 Die Walküre, Opera North,
Fotografia: Clive Barda. Disponível em http://www.operanorth.co.uk
 
Foi-lhe ofertada a música invisível
que é o dom do tempo e que no tempo cessa;
foi-lhe ofertada a trágica beleza,
foi-lhe ofertado o amor, coisa terrível.
 
(Jorge Luis Borges, os dons in Atlas,
 trad. de Heloisa Jahn)


Existe um amar que nada exige, dizia-me seu silêncio. Eu ria de tamanha ingenuidade. Existe um amar que deixa partir, dizia-me seu gesto de desapego. Eu duvidava de tal desprendimento. Existe um amar que desconhece o relógio, dizia-me sua espera infinita. Eu via a ferocidade do tempo. Existe um amar que veda os olhos para as curvas do espaço, dizia-me o alcance de sua vista. Eu insistia no fosso escuro das distâncias. Até encontrar crianças invadindo as manhãs. Até acordar sem manhãs quando elas se vão. Isso me vem à mente quando um vento frio me obriga a vestir o casaco na saída do teatro, em pleno verão.

São 16h30. As luzes da platéia se apagam. O palco se ilumina. Um maestro magistralmente assume seu posto. O ritmo das palavras chega aos meus ouvidos com estranheza diante da minha ignorância da língua alemã. Meus olhos aflitos se alternam entre projeção de imagens, performances dramáticas e legendas em inglês. Minha mente perdida no turbilhão da tradução faz conexões com a sinopse gentilmente apresentada no embalo de uma conversa na noite anterior. Contudo, algo invade meu corpo, bem do lado do cérebro que é coração, e arrebata meu ser racional, afogando-o em estado de graça e tensão por exatas cinco horas e meia. 

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Passagem

 
Passos para a luz,  por Sergia A.



Um olhar conduz
 Entre sombras, tons de azul:
Certeza de luz.

sábado, 3 de novembro de 2012

Renúncia


Última luz,  por  Sergia A.


A sombra anuncia
Do não dito, o rompimento:
A morte do dia.


 

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Realismo poético


Iranian woman visiting Persepolis
Persia: ancient soul of Iran: Marguerite Del Giudice 
Fotografia: Newsha Tavakolian
Fonte: National Geographic Magazine, Agosto/2008



A window is enough for me.
A window to the instance of light, insight and peace. [1]

 
Para entender Walter Salles é preciso conhecer o cinema iraniano, me disseram um dia desses. E eu, que só tinha visto ligeiramente, por acaso em noites insones,  Filhos do Paraíso (Majid Majidi, 1997) e O Silêncio (Mohsen Markhmalbaf, 1998), fiquei boiando.

Para entender o cinema iraniano é preciso entender a cultura persa, me disseram. E haja esforço para lembrar os velhos compêndios de História Geral. Aryan... império persa... cyrus... darios I, II, III... alexandre. E aí, um insight. Alexandre, que não era bobo, se rendeu à cultura persa, adotou seus métodos administrativos e casou-se com Roxana.  

Para conhecer o Irã e o que o Irã realmente é, basta ler uma transcrição de Cyrus. Disse Shirin Ebadi, advogada iraniana e ativista dos direitos humanos, quando ganhou o Nobel da Paz em 2003. Referia-se ao conceito de liberdade e direitos humanos que, dizem os iranianos, não pertence aos clássicos gregos, mas a esse Imperador que no século VI a.C tinha a sabedoria de respeitar costumes e crenças dos povos conquistados. E daí? O que isso tem a ver com cinema? 

domingo, 7 de outubro de 2012

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Onde foi parar a minha alma?

 
Saudade dourada,  por Sergia A.
praia peito de moça - Luis Correia-PI
 

Eu tinha uma alma. E ela era pura. Trabalhava arduamente para isso. De joelhos, controlava os impulsos de manchá-la um pouquinho. Nada de mais, algumas nódoas de frutas roubadas dos quintais. Nada mais. E assim ela se conservava. Afastada do meu corpo. Aconchegada no colo dos deuses.

Eu tinha uma alma. E ela habitava em mim. Largou as nuvens brancas e se alojou na minha mente. Trabalhava arduamente pela sua coerência. O peito inflado de certezas que douravam minha racionalidade. Pouco importava se diziam ser fruto de processos inconscientes infinitos.  A ela entregava meus mais (im)puros sentimentos. Havia um super-ego, por sorte. E ela se conservava em mim. Afastada do meu corpo. Aconchegada em aura flutuante.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Espelho


 
Ilusão,  por Sergia A.
 
 
A lâmina inerte
 Do outro vago limiar
O registro inverte

 

sábado, 22 de setembro de 2012

Desejo de Renovação

 
Sonho verde amarelo, por  Sergia A.


Um dia desses uma amiga postou no facebook um desejo: precisava de um outono. Lembrei de um texto que escrevi aqui sobre a simbologia dessa estação e a universalidade da conduta humana em dadas circunstâncias. Hoje quero estendê-lo aos seres da natureza. Às vezes somos irremediavelmente iguais. Talvez um traço da evolução. Afinal, reagir a seus estímulos foi o que nos garantiu a vida e os avanços da inteligência. Somos fortemente influenciados por seus movimentos. Talvez por isso, eu tenha despertado no meio da noite com um desejo incontrolável: preciso de primavera.  

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Toque inevitável


Tocável,   por Sergia A.


As viagens sempre foram, para nós, investimento. Valiam e continuam valendo qualquer sacrifício. Depois de desvendar as diferenças regionais deste país continental, sentimos necessidade de ir mais longe. Foi assim que estivemos em Londres em dezembro de 1995. Elas, crianças, riam de tudo. Eu amedrontada, cismava do mesmo tudo. Sob o peso dos casacos, meus ossos tremiam. As botas de couro maltratavam meus pés habituados à liberdade das areias mornas. Elas, em seus tênis coloridos, deslizavam livremente sobre a novidade da neve.

O hotel simples ficava próximo ao Regent Park, o que facilitava muito a minha vida. Sem grandes programações nos permitíamos andar, despreocupadamente. Sentir o clima das ruas, o cheiro do novo. De vez em quando seguíamos um roteiro turístico curto. O prazer delas estava em primeiro lugar. Os monumentos passando e as figuras nas ruas era o que mais prendia a atenção. Ele negro, dread nos cabelos. Ela branca, pierces e correntes do nariz à orelha. Ele vestia uma túnica clara. Elas com véus escondendo os cabelos o seguiam poucos passos atrás. Yuppies, em ternos bem cortados, nos atropelando em sua pressa. A sonoridade das línguas orientais provocando ondas de risos intermináveis. O diferente existe e precisava ser visto, de perto, sempre que possível. Essa era a intenção.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

sábado, 8 de setembro de 2012

Instante

Todos os dias quando acordo
Não tenho mais
o tempo que passou
mas tenho muito tempo
Temos todo o tempo do mundo


(Renato Russo in Tempo Perdido)


Passado presente,  por Sergia A.
 

Abro os olhos e o momento se foi. Fecho os olhos e estou novamente na estrada que corta uma paisagem de rara beleza. Pontes, torres, braços de mar, barcos, lagos, velas. Cenários de sonho ou realidade momentânea. O sol que insiste em resumir a noite em poucas horas me faz perder a noção do tempo. E ele continua aqui, impávido, pairando sobre mim.

sábado, 1 de setembro de 2012

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Tempo de encontrar a rima


Teatro Palácio das Artes - Belo Horizonte/MG jun/2006
Fonte: YouTube

No fim de um dia turbulento no trabalho, larguei tudo e, um tanto sem rumo, com medo de contaminar meu doce lar com toda a minha angústia, decidi passar no Teatro 04 de Setembro para ver o que estava acontecendo. Havia um show. A bilheteria estava fechando. O nome do artista me era desconhecido.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

O Belo e o Incômodo



O filme serve para exercitar o homem nas novas percepções
e reações exigidas por um aparelho técnico cujo papel cresce
cada vez mais em sua vida cotidiana.
Fazer do gigantesco aparelho técnico do nosso tempo
o objeto das inervações humanas – é essa a tarefa
história cuja realização dá ao cinema o seu verdadeiro sentido.
(Walter Benjamim, in Magia e Técnica, Arte e Política –
Trad. Sergio P. Rouanet, p. 174)

Gefion e seus filhos,  por Sergia A.

Filmes de entretenimento. Filmes hollywoodianos. Filmes comerciais.
O que mais? Como denominar a produção cultural que parece dominar o imaginário coletivo mundial e se reproduz como praga?
Mas, convenhamos, quem resiste a uma adocicada comédia romântica? Ou às fórmulas imutáveis e os efeitos especiais dos filmes de ação? Eles conhecem bem nossos anseios ou, quem sabe, somos produtos dessa indústria, desenvolvidos para consumi-la.
Todavia não fomos completamente vencidos. Teimosamente surgem de vez em quando, alguns heróis, rebeldes, revolucionários prontos a nos redimir. Foi assim na década de 1920 com o Expressionismo alemão ou, na década de 1950 com Neo-realismo italiano ou, nos anos 1960 com a Nouvelle Vague na França e o Cinema Novo no Brasil. Ou, ainda, mais recentemente, com o Dogma95 na Dinamarca.

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Luz repetida,  por Sergia A.


Brilha sobre a mesa
Testemunho repetido
Nas chamas acesas.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Do Laboratório: O desligamento

"...and in their grey and white curve a world was reflected"  *


E um ano se passou sem que eu me desse conta da real intensidade dos seus dias...
Apesar de nomeá-lo como o primeiro da segunda parte, o havia imaginado como tempo de preparação. Agora o vendo já como um tempo passado, o sinto como um tempo de iniciação, com toda a alternância de dúvidas e euforia, mas solidamente edificado pela fragilidade das minhas mãos.

Engraçado é que o que me vem à mente nesta data comemorativa, talvez ainda em conseqüência do excesso de estímulos a que me submeti no último mês, é o filme Girl With a Pearl Earring (2003), Moça com Brinco de Pérola na tradução brasileira:


Vitrines no alto,   por Sergia A.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Ao vento


Sombra,   por  Sergia A.


Sentindo sob meus pés andarilhos a firmeza do chão da minha terra, e sob uma luz intensa amortecida pelas lentes, a alegria do reencontro com a leveza e a inocência.

Dias de flores e doçura, propícios e necessários para que se acomode na lembrança o turbilhão e para que se redirecione o pensamento rumo ao balanço de um novo vento.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Densidade, delicadeza e elegância


Verde e lilás, por  Sergia A.

O ônibus desliza suavemente sobre a perfeição da estrada. Fixo o olhar na velocidade da janela aberta para campos arados e modernos moinhos de vento, As curvas trazem ora a densidade dos bosques ora a inclinação dos telhados em torno de torres medievais, que aderem à transparência do vidro impondo-me a paisagem dos cartões postais. Fecho os olhos e apuro sons perdidos na infância.

domingo, 15 de julho de 2012

Feminino


Bruxas in Goslar-DE,  por  Sergia A.


Caldeira, vassoura
Sentimento do infinito,
Vivo, no vapor

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Do laboratório: E Paris sempre será uma festa móvel.


O décimo primeiro mês do primeiro ano da segunda parte se foi. Os longos anos da primeira parte, por vezes confinados em uma passagem estreita, carimbam agora meu passaporte:


Janelas Floridas, por  Sergia A.


Se você teve a sorte de viver em Paris quando jovem,
sua presença irá acompanhá-lo pelo resto da vida,
onde quer que você esteja, porque Paris é uma festa móvel.

 (Ernest Hemingway, em carta a um amigo, 1950)


Sempre fica a sensação, de que os dias são curtos, embora tão longos nesta estação abençoada pelo sol. Fico sonhando com as horas em que meus pés tocarão preguiçosamente esse chão sem a pressa dos guias ou sem a ânsia de consumir monumentos, parques e museus antes que o meu tempo os devore sem mim.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

quinta-feira, 21 de junho de 2012

A cor de junho



Qui nem jiló (Luiz Gonzaga/Humberto Teixeira)
Show Fé na Festa, Gilberto Gil (2010)
Fonte: YouTube


Junho andava esquisito. Um estranho céu cinza, poeirento, deu pra invadir minha janela nas manhãs. Por pura rabugice, fiquei uns dias maldizendo a volúpia dos construtores. Neste tempo de euforia imobiliária, não se desperdiça um quintal verde nos arredores. De repente, talvez se aliando a minha indignação, o céu  se vestiu de nuvens escuras, e ao sair do trabalho enfrentei ruas alagadas. O tempo está louco, me disseram os mendigos correndo para se abrigar.

terça-feira, 12 de junho de 2012

Um sinal?


Teresina pela janela,  por Sergia A.


Alguns dias depois que um passarinho verde visitou o meu quarto,  um enorme morcego se achou no direito de fazer o mesmo. De onde veio, não faço a menor idéia. Disseram-me que não era vampiro. Bom, vampiro ou não, o certo é que heroicamente eu derrotei o intruso.

domingo, 10 de junho de 2012

Luas



Janela para o céu da cidade,  por Sergia A.


Íntima da noite
A névoa muda e fria
Fere, como açoite



quarta-feira, 6 de junho de 2012

Do Laboratório: Treinando o desapego



Agora se foi o décimo mês... o tempo é veloz e a segunda parte toma impulso a cada dia...

Liberdade em fundo azul,  por Sergia A.



Hoje, nada de filmes ou livros densos. Quem sabe umas boas páginas de leitura colorida, leve.
Talvez alguns pitacos sobre assuntos sérios aqui e ali, afinal nada é perfeito. E bem que eu precisava dessa leveza  ...ou dos pitacos, ninguém é de ferro.
Desapego!
É o caminho se queremos deixar de lado uma velha fórmula para abraçar algo novo.
E eu treinada. Pronta para o voo. Na bagagem, certezas chacoalhadas.

sábado, 2 de junho de 2012

Quando o futuro é apenas um caminho não trilhado


To die by your side (2011), by Spike Jonze e Simon Cahn
Fonte: YouTube


Anoitece. Uma livraria cerra suas portas. As personagens dos livros ganham vida. Tudo pode acontecer... inclusive um intrigante mergulho em William Faulkner.

Completamente por acaso, em uma das minhas peregrinações por sites interessantes (e são tantos... amo essa liberdade proporcionada pela tecnologia) encontrei um comentário sobre o curta To die by your side (2011), dirigido por Spike Jonze e Simon Cahn. Curiosa, devorei avidamente os seus seis minutos de diálogo intenso com clássicos da literatura de língua inglesa, e mais alguns minutos do making of, para compreender que além da homenagem explícita à Literatura o filme pode ser entendido como uma metáfora do processo de criação da arte contemporânea.

domingo, 27 de maio de 2012

Sem remorsos ou indecisões



Janela para as nuvens,  por Sergia A.


Virgínia me acordou cedo.
Havia um vazio no quarto amanhecendo. Minha janela para o Leste não se rende à sisudez de cortinas ou persianas, e insiste em dar passagem a uma fresta de luz enrubescida. Não quero despertar. É domingo, meu sono tem direito a algumas voltas do ponteiro. Desisto. Estendo a mão e abro um livro de cabeceira. Um diário a me provocar... O ano é 1930:

quinta-feira, 24 de maio de 2012

sábado, 19 de maio de 2012

Círculo Ardente



Les uns et les autres, por Claude Lelouch (1981)
Fonte: YouTube


A alma ativa e obcecada
enrola-se infinitamente numa espiral de desejo
e melancolia
Infinita, infinitamente...
As mãos não tocam jamais o aéreo objeto
esquiva ondulação evanescente
Os olhos, magnetizados, escutam
e no círculo ardente nossa vida para sempre está presa
está presa...
Os tambores abafam a morte do Imperador.[1]




Como muitas pessoas nascidas do lado de baixo do Equador, posso dizer que conheci Bolero de Ravel pelo cinema nos anos 1980. Não vi o filme Les uns et les autres, direção e roteiro de Claude Lelouch (Retratos da Vida, na tradução brasileira) em salas de cinema, claro, eu moro em Teresina. Mas alguns anos depois tivemos o boom dos vídeo cassetes (bendita tecnologia, eu vivo para bendizê-la). Sabe aqueles de quatro cabeças comprados na Zona Franca de Manaus? Pois é, tive a felicidade de ter um. Talvez ao mesmo tempo em que a maternidade me despertava o interesse pela arte da dança. Bom, mas o certo é que a arte de outro Maurice, deixou em mim as marcas da música já associada à dança. Agora, tantos anos depois me chega, em uma sala de aula, a oportunidade de ler o Bolero de Drummond de uma forma nova. De arrepiar, pensei...

domingo, 13 de maio de 2012

Falando de Flores no dia das Mães



Varanda, por Sergia A.


Às vezes, nessas ocasiões, me pego pensando sobre esse endeusamento do papel de mãe e junto com ele o bombardeio de estímulos ao consumo para movimentar a economia. Pior que isso são as mensagens subliminares, como que a condenar as mulheres que ousam dizer não à maternidade, negando o suposto instinto maternal. Sem dúvidas gerar vidas tem raízes no sagrado. Talvez por isso o amor materno seja uma exigência. E ai de quem se negar a vivê-lo.

Na contramão, penso nesse instante nas mulheres que por livre escolha ou por motivos diversos abdicam da maternidade, e se dedicam a dar à luz outros projetos. Penso também na culpa que sentimos quando tentamos conciliar dois caminhos. É possível ser essa mãe maravilhosa, ou não sentir culpa por não ser? Tenho cá as minhas dúvidas. Como seres fragmentados do nosso tempo, temos dentro de nós o duplo sentimento: de um lado o encantamento, amor incondicional e prazer em cuidar dos filhos e de outro o sentimento abafado de que limitamos a nossa vida por causa deles.

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Fantasia



A dois ou Mergulho no Infinito,  por Sergia A.


Buscam o argumento
das fronteiras diluídas,
nas frestas do tempo.

domingo, 6 de maio de 2012

Ganhando nova vida

Já se foram noves meses. 

Where Books Come to Life,  por Anderson M Studio
Fonte: YouTube

Tenho dedicado boa parte do meu tempo, neste primeiro ano da segunda parte, a estudar a relação entre as artes, e mais especificamente entre Literatura e Cinema. Não me acho, ainda, capaz de publicar nada sério sobre isso. Mas, de vez em quando, alguma coisa me provoca e não consigo conter as palavras e seus delírios. Alucinadas elas me atormentam até encontrarem uma página em branco para deleitarem-se. É o paraíso. É assim que se movimenta esse blog. Aliás, existe algo mais ilusoriamente democrático do que um blog? Eu publico, ninguém me dá nota e ainda corro o risco de alguém gostar dos meus argumentos. É verdade que, como diz Jaron Lenier, minha produção contribui com um grãozinho a mais nos papos de alguns jovens milionários, e nada para mim é claro, já que prazer não se conta em moedas. Mas a opção é livremente minha. Então vamos ao que interessa...

domingo, 29 de abril de 2012

Aquarela



Cores em fuga,  por Sergia A.


No branco, o verdor
de múltiplos tons sorvidos
no preto sem cor.


terça-feira, 24 de abril de 2012

Sobrevida


Uma corda para o céu,  por Sergia A.



Esvai-se o momento
Livre em sua fragilidade,
Alçada no vento
 

terça-feira, 17 de abril de 2012

Argumento




Não atendi ao chamado. Estava sem tempo, argumentei de forma convincente. Mas, afinal, o que é o tempo?
Um pensamento insistente sacode a quietude da noite. Já não há remédio, só o exercício de leitura e tradução, renitente como um pedido de misericórdia.
Que o ritmo elegante e a complexa simplicidade do poema de Robert Frost purifiquem a minha alma, com o perdão para o duplo pecado:

A Time to Talk

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Afeto


O Primeiro Beijo,  por Sergia A.
Pintura rupestre descoberta em 1973 na Toca do Vento
Parque Nacional da Serra da Capivara - PI


Sexta-feira, treze. E eu aqui querendo falar de sentimentos, daquilo que nos toca, nos move, nos define. Falar de sinos, de estrelas, de borboletas no estômago, de uma voz enrouquecida que sussurra ao meu ouvido: estou viva.
Falar do não dito, do proibido, daquilo que a garganta guarda para ruminar em noites insones.

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Do Laboratorio: a arte de servir


Foi-se o oitavo mês. O primeiro ano avança entre novas descobertas, lembranças e reflexões.



Foto de reprodução do original de Liz Medeiros (2002)


Já disse aqui uma vez que adoro dicionários. Eles estão sempre prontos para me socorrer quando o pensamento deseja ardentemente ter uma forma concreta. Algumas vezes percebo certa conspiração do universo para que esse convívio se materialize. Vejam se não tenho razão. Em um dia um amigo me chama a atenção para a origem do meu nome, muito provavelmente do Etrusco, depois do Latim (sergius) dizia ele meio constrangido para me confirmar o significado em bom português: “servo, escravo”.  No outro, por causa de uma pessoa querida, eu que não tenho prática religiosa há anos, senti um nó na garganta e não segurei a lágrima ao ouvir a voz grave de um coral octeto enchendo uma Igreja com a beleza e lição de humildade da Oração de São Francisco. Como se não bastasse, no dia seguinte recebo um convite para participar de uma reunião informal de apreciadores de vinho. O grupo carinhosamente se autodenomina CONFRALIZ, em homenagem a um dos seus integrantes fundadores que já não está entre nós fisicamente, a artista plástica autora do desenho que hoje ilustra esta página e inspira o texto.

terça-feira, 3 de abril de 2012

Púrpura


Cores da tarde,  por Sergia A.


Em traje solene,
a tarde silencia o azul.
Noite, de repente.

sábado, 24 de março de 2012

AntiTempestade



 Janela para o amanhecer,  por Sergia A.


Em risco ele nasce,
Entre nuvens e antenas
Encontra um disfarce.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Se eu lesse mais romances russos


The Kids Are All Right,  por Lisa Cholodenko, 2010
Fonte: YouTube

Um dia desses vendo um filme despretensioso, escutei no meio de uma cena de discussão de relação essa pérola que hoje dá título e inspira os meus delírios. No contexto, a frase parecia surgir para garantir o tom de comédia em meio a uma situação dramática, ou no mínimo como um discurso irônico da diretora/roteirista se intrometendo na fala das personagens. Mas, o certo é que me chamou a atenção e me fez pensar até que ponto a arte, e em especial a literatura, direciona nosso olhar para o que não vemos na superfície.

domingo, 18 de março de 2012

Café de Domingo II


Bandeja para domingos,   por Sergia A.



Em boa companhia
nas manhãs, café tem cores
e cheiro de tia.

sexta-feira, 16 de março de 2012

Rabiscos e Fragmentos


Virginia,  por Sergia A.

Há alguns anos enfrentei o inverno do Sul para acompanhar uma aspirante a bailarina durante o famoso festival de dança de Joinville. Minha pupila tinha agenda lotada entre cursos, treinamentos e espetáculos. Na minha só os espetáculos noturnos, aliás de encher os olhos e deixar a alma leve. Em uma tarde decidi encarar o frio caminhando pelas ruas, praças e shoppings. Andando à toa dei de cara com uma livraria enorme. Entrei para tomar um café e fazer uma das minhas atividades favoritas: passar um tempo entre livros. Descobri algumas estantes de literatura de língua inglesa, uma delas com publicações mais velhas em promoção. Fiquei enlouquecida. O vendedor, pressentindo uma boa venda, educadamente me ofereceu um banquinho, e ali sentada eu corri mundos até que o relógio anunciou a hora de levar minha pequena bailarina para jantar.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Vazio


A Noite,    por Sergia A.


Na noite imensa
Tudo em volta adormece
Menos tua ausência.

terça-feira, 6 de março de 2012

Do Laboratório: Gotas Cristalinas


E já se foi o sétimo mês do primeiro ano da segunda parte. Tempo de recomeço, quando sentimentos se misturam enquanto as experiências continuam fervilhando no laboratório ou na lembrança.



E Deus falou para Noé e seus filhos com ele, dizendo:
"...Este será o sinal da aliança que estou fazendo entre mim e vós
e todo ser vivente que está convosco, por todas as gerações.
"Meu arco-íris pus na nuvem ... Quando o arco-íris puder ser visto nas nuvens,
vou lembrar minha aliança ...
Nunca mais as águas se tornarão em dilúvio para destruir toda carne. "
(Gênesis 9:8-15)




Janela para o arco-íris,  por Sergia A.



De vez em quando um arco-íris invade minha janela. Nessas ocasiões faço questão de esquecer o fenômeno físico da refração da luz. Gosto de pensá-los como sinais. Pura bobagem de quem ainda se dá ao luxo de olhar para o céu. Desta vez o seu espectro colorido me transportou pelos labirintos da primeira parte. Sinais?

Quando suas portas se abriram para mim, vivíamos ainda um tempo nebuloso. Sob o comando de um General que preferia o cheiro de cavalo ao cheiro do povo, a ditadura agonizava propondo uma abertura lenta e gradual. Beneficiados pela lei de anistia os exilados estavam de volta levando às universidades, aos sindicatos e às ruas o toque de despertar. Timidamente voltávamos a ter o direito ao sonho democrático. O Banco como produto dessa sociedade reproduzia esse mundo conflituoso, de normas rígidas e pessoas dispostas a transgredi-las. Entretanto, as transformações seguiam os passos lentos e graduais da cavalaria que ainda dispunha de mãos de ferro. Manter-se vivo, depois do dilúvio, significava fazer alianças.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Navegante II


Janela para as nuvens,  por Sergia A.



Ícaro à deriva
Sem leme em mar de nuvens:
Voo ou queda livre.

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Conjugando o Verbo Perder


In Her Shoes, por Curtis Hanson (2005)
Fonte: YouTube

O vento soprava frio na varanda que amanheceu sem sol. Sou assim, passo mal e reclamo dos 40 graus, mas sinto nos ossos os 22 das manhãs que se seguem a noites chuvosas. Fugindo do vento na varanda, o café de domingo se resignou ao sofá da sala, ao lado de um sedutor controle remoto e uma tela magnética. Uma oportunidade de ver, nas sessões repetidas, Cameron Diaz compondo uma cena em que a personagem aprende a ler poemas seguindo a cadência de Elizabeth Bishop (1911-1979) em One Art, no drama hollywoodiano In her Shoes (Em seu Lugar, na tradução brasileira) do diretor americano Curtis Hanson (2005).

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Tambores



Cor Ritmada,  por Sergia A.



Nas ruas euforia,
Prazer coletivo em rito:
um culto à alegria.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Entre Silêncios e Entrelinhas



Foram-se seis meses do primeiro ano da segunda parte. Hoje meu delírio não nasce de uma experiência do laboratório, no entanto, de alguma forma, explica a minha vida dupla:


Atonement, by Joe Wright (2007)
Fonte: YouTube



Alguém disse certa vez que narrar é um exercício do perdão. Mais que redimir-se de uma culpa, de uma ofensa ou de uma dívida, o ato de narrar talvez se aproxime da busca de liberdade que só se realiza no percurso entre a mente que elabora o pensamento e a concretude da palavra que o liberta. Essa pode ser, por exemplo, uma leitura do livro Atonement, do escritor britânico Ian McEwan (2001), que na tradução brasileira recebeu o título de Reparação.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Quando o dia pede rosas


Porque ele vem até mim,  Sergia A.


Porque um dia nos conhecemos, e havia nuvens carregadas no céu. Porque um dia nos demos as mãos em praça pública e enfrentamos os raios. Porque um dia tivemos o mesmo sonho. Porque saímos a arar campos diversos quando o céu estava azul. Porque na colheita descobrimos que não importava como balançavam os galhos se as raízes se alimentassem da mesma seiva.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Reverso



Céu de Pipa,   por Sergia A.


Solto ao vento
Em sussurros, meu segredo
Vazado, em tempo.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Para Linha Reta, a Leveza das Curvas



A Beautiful Mind (2001), by Ron Howard
Fonte: YouTube
Do fundo da inconsciência
Da alma sobriamente louca
Tirei poesia e ciência,
      E não pouca
Maravilha do inconsciente!
Em sonho, sonhos criei.
E o mundo atônito sente
Como é belo o que lhe dei.
[1]


Além das lendas, vagavam pelas ruas adormecidas do lugar onde eu nasci figuras quixotescas que enchiam minha infância de temores. Prenhes de histórias nos envolviam nos férteis labirintos de suas mentes desconectadas daquilo que chamamos realidade. Deve vir daí a minha necessidade de sentir o pulsar do chão depois de acompanhar vôos insólitos. Ou talvez, a compreensão de que uma vida de lucidez comporta momentos de fuga, necessários para que não haja inversão da ordem.

Estridente, o telefone toca no meio da noite. Entre soluços ela me diz que arruinou a vida das pessoas que amava e por isso está sendo perseguida. Existe uma investigação sobre seus crimes. Escuto silenciosa a sofreguidão da sua voz. Há uma pausa. Tento dizer alguma coisa que estimule a continuidade do relato. Peço que respire devagar, e repita algumas palavras. Ela me interrompe ao ouvir batidas na porta. Diz que são os vizinhos prontos para denunciá-la por violação da moral e dos bons costumes. Digo que não ouço as batidas da porta. Ela insiste que estão cada vez mais fortes. Ouve sirenes. Não consigo ouvir o som ao fundo da nossa conversa. Convenço-lhe a não abrir a porta. Esforço-me para manter na voz o tom de serenidade que tende a se ausentar. Faço perguntas. Falamos de outros tempos. Deixo-me envolver na ameaça dos seus moinhos de vento. A voz agora é sonolenta. A química a traz de volta à solidão dos seus lençóis. Desligo.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Melodia que Nunca Silencia


A Literatura e o Cinema caminham lado a lado. Mesmo nos filmes mais comerciais e de enredos repetitivos, esse encontro é ponto de diálogo que enriquece a narrativa fílmica e deixa pistas para a construção de sentidos. Assim é que Autumn in New York (2000), dirigido por Joan Chen, pode ser visto como uma tradução de dois poemas de Emily Dickinson (1830-1886):  "Two butterflies went out at noon" e  "Hope is the thing with feathers"



Fonte: YouTube

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Navegante



Janela para o mar,  por Sergia A.


À deriva, o barco
Do mar se descobre cúmplice
Vento, vela e mastro.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Da Série O Laboratório: Nada é para Sempre


Já se foi o quinto mês do primeiro ano da segunda parte...

 

Recortes da Memória,   por Sergia A.


Uma data simbólica. Passada a ressaca do Réveillon, é hora de desmontar a árvore de natal e retomar a vida que se entrega a um novo ciclo. Laços dourados desfeitos, fios do pisca-pisca de volta à embalagem, peças de decoração acumuladas durantes anos, reformadas aqui e ali, retomam seu lugar no canto mais alto do armário. Uma angústia repentina tenta sufocar o peito ao pensar o significado desse ritual cíclico. Talvez por isso, para escrever este texto eu tenha me apropriado do título da tradução brasileira do filme A River Runs Through It (1992), que apesar de não ter nenhuma relação com o título original e não fazer justiça com a premiada imagem poética que Robert Redford criou para seu personagem principal (o rio), me ajudou a despertar para essa realidade difícil de ser absorvida quando vivemos a ilusão de ter a posse sobre coisas ou pessoas.

Mas não é o filme que hoje afasta minhas palavras do trilho, embora, a narrativa que ora me toca também seja uma lembrança antiga. De quando, por pura curiosidade, visitava Dostoiévski nas estantes empoeiradas, ainda sem noção da grandiosidade de sua obra. Apenas lia e guardava na memória a estranheza. Desmontar a árvore me fez lembrar um dos contos do primeiro volume das Obras Completas: Uma Árvore de Natal e um Casamento[1], escrito em 1848. Exatamente o trecho em que as crianças, sob o olhar indiferente dos adultos, “despojavam a árvore de natal de todos os seus enfeites” em busca dos presentes que nem sabiam serem seus.