sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Éramos seis (parte II - O risco das pedras)


may my heart always be open to little
birds who are the secrets of living

(E. E. Cummings in Selected Poems p.49)


arlequim sobre pedras, por Sergia A.


Percorrer os caminhos de uma festa literária, alguém me alerta, é correr riscos incalculáveis. Por pura teimosia decido me aventurar. Eis alguns que consigo listar:

É correr o risco de margear, entre ciclistas e caminhantes apressados, um espelho d’água que te devolve os raios da manhã. De cruzar arcos de concreto entre bandeiras esvoaçantes. Alinhavar passos entre ruas estreitas. Torcer para que um céu azul alivie a lisura das pedras. Trocar saltos elegantes por emborrachados de bico arredondado. Enlouquecer diante da programação que não se alcança. É correr o risco de acender uma centelha a cada tropeço, e descobrir um universo que explode ali do lado impunemente.

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Éramos seis (Parte I - do início)


(...) há essência nas substâncias criadas intelectuais, nas quais
o ser é outra coisa que essa essência, embora tal essência  seja sem
matéria. Por isso o ser delas não é absoluto, mas recebido: donde
também, limitado e finito, conforme a capacidade da natureza recipiente.

(S. Tomás de Aquino in O Ente e a Essência p.84, trad. D. Odílio Moura)


 
A janela o café, por Sergia A.
 

Sim, estou me apropriando do título de uma novela que eu adorava. Assim como a novela se fez a partir do romance de Maria José Dupré (1943), que não li. Irmãos descobrindo o ser, sob a batuta de uma mãe zelosa. Sim, somos irmãs (se o termo significar ligação profunda). Arrebanhadas pela vida. Ao invés de sangue, temos sonhos comuns. Um deles nos traz até aqui. Estamos na nova ala de embarque do JK. Somos quatro direcionando o olhar ao longo corredor em busca da quinta. Ponho a jaqueta. O dia desperta frio. O café alimenta o tempo de espera. Espremida entre assentos de um avião a alegria juvenil. Somos cinco.

A chuva encobre parcialmente a beleza do cartão postal. O táxi nos abandona diante da escadaria de um prédio antigo. Os degraus se prolongam com o peso da mala. O cabelo se desmonta. Por instante sinto falta do profissionalismo da recepção de hotel, cuja impessoalidade decidimos evitar. A janela salva o dia. Em meio ao desespero, somos olhos embevecidos. São três horas da tarde. Somos seis ao redor de uma mesa de um bar antigo. José de Alencar é pouso para pombos. Getúlio em seu leito de morte, logo ali. Um chope para aproximar a sétima, cuja graça dispensa qualquer esforço. Aceitamos o convite perfeito para dia de chuva. Somos sete em uma alegre sala de estar. Um café, boas risadas, uma morada que respira arte abrindo portas para o abrigo de duas com passado comum. 

domingo, 10 de agosto de 2014

Das sementes



em movimento, por Sergia A.


Ali, entre milhões,
uma seguiu enlouquecida:
eis-me aqui, embrião.


P.S.:  Feliz dia dos pais!