domingo, 17 de janeiro de 2016

Cartas da Itália: Florença


Si tuviese lector, más largo espacio
para escribir, en parte cantaría
de aquel dulce beber que nunca sacia; 


mas como están completos ya los pliegos
que al cántico segundo destinaba,
no me deja seguir del arte el freno. 

De aquel agua santísima volví
transformado como una planta nueva
con un nuevo follaje renovada,

puro y dispuesto a alzarme a las estrellas.

(Dante Alighieri, Canto XXXIII de Purgatório in A Divina Comédia)




entrada, por Sergia A.

Florença, 14/10/2015

Querida L.

Uma linha direta, menos de uma hora de trem e cá estou antes do meio dia. A ordem é largar malas e curvar-me de espanto logo na primeira esquina. Visão que tento te repassar nas imagens acima - uma ligeira ideia da riqueza de detalhes, cores, e rumores que o berço do renascimento espontaneamente oferece de entrada. 

o verde, por Sergia A.

Fiquei em dúvida se devia escrever na identificação de local Florença ou Toscana (a região). Apesar da certeza de que não seria desperdício ficar perambulando entre grandes mestres e jovens pintores de aquarela todos esses dias, resolvi visitar os arredores em dias alternados. E a região me encanta e confirma a expectativa criada pelos filmes e livros que a tornam ao mesmo tempo familiar e desejada. No entanto, o ar de Firenzi me toca a ponto de relevar as seis noites mal dormidas e a reação alérgica do meu corpo aos seres minúsculos e invisíveis que se escondem nos prédios antigos.




Fonte de Netuno - Bartolomeo Ammannati (1559), por Sergia A.

Sim, hospedei-me no centro histórico, rodeada de Igrejas e a poucos metros da Piazza del Duomo. Sabe aquelas portas de madeira enormes, pesadas, que rangem para encher de suspense as cenas de filme? Pois é por uma delas que tenho acesso à minha acomodação. Os anfitriões são simpáticos, mas o lugar é assombroso. Lá fora a cidade não dorme e os sinos repicam a cada hora. Talvez os que vêm até aqui entendem que dormir seja deixar escapar muito do que se pode explorar desta preciosa relação espaço/tempo. Aqui dentro também não durmo, escuto a música e as vozes alteradas das ruas, e fico a imaginar as vidas que por aqui passam por séculos e séculos e séculos. Aproveito, assim, a última noite para te enviar alguma coisa da beleza desses dias chuvosos, frios e arrebatadores (que mais eu podia desejar?)


o Arno a ponte, por Sergia A.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Canto de agradecer




dia de reis, por Sergia A.


Há na tua lente
sem truques
nem filtros
pele
vivida sob o sol
rugas
marcando olhares
e risos
há sob os óculos
bolsas
de noites insones.
Na tua lente
sem reparos digitais
a luz escreve
tempo
em corpo de gente

sábado, 2 de janeiro de 2016

Há de ser



o botão, por Sergia A.


Não precisa ser 
novo o ano
para que se renove o olhar
dizem-me as letras 
cansadas de vícios
mas eis que são novos
o ano e o olhar
ainda que envelhecidos 
de tanto renascer