tag:blogger.com,1999:blog-81996444415123704282023-11-16T15:48:50.737-03:00Palavras de.LirantesSergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.comBlogger296125tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-45745253478610306642020-12-31T08:00:00.054-03:002020-12-31T13:26:38.503-03:002020: o ano do umbigo<p style="text-align: justify;"> </p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEieylgwFpPoMUTZ7aabioFCsVaC5AylD95Za6sz6oCDhF6ezLf76oGiuAxbR9gm5YYYdE_gKIvV2YDaqjmZmfbtJWm5Ft6HYHB-Dx2yBsEgS61_6KWPtefm5EtHi2RjAXE0D8Iyhl1Mc6g/s977/New+stars+nasa.jpeg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="977" data-original-width="828" height="433" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEieylgwFpPoMUTZ7aabioFCsVaC5AylD95Za6sz6oCDhF6ezLf76oGiuAxbR9gm5YYYdE_gKIvV2YDaqjmZmfbtJWm5Ft6HYHB-Dx2yBsEgS61_6KWPtefm5EtHi2RjAXE0D8Iyhl1Mc6g/w529-h433/New+stars+nasa.jpeg" width="529" /></a></div><div style="text-align: center;"> <span style="font-size: x-small;">Newborn stars - NASA/JPL - Caltech/ P.S. Teixeira (Center for Astrophisics) 25/12/2020 </span> </div><p style="text-align: justify;"><br /></p><br /><div style="text-align: justify;">Foi longo o tempo sem estar aqui. Hoje senti vontade de ter esta conversa solta, sem gênero literário e acreditando que do outro lado alguém me escuta. Só para fazer retrospectiva e aliviar as horas do fim de um ano que pareceu interminável.</div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Parecia auspicioso nos encontros de janeiro. Fevereiro trouxe o alerta. Março fechou para balanço. Entendi desde o princípio como uma guerra. Uma guerra biológica que geraria crises sem precedentes. Sanitária, econômica, política e de valores</div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Tempo. Quem conhece um pouco de ciência ou, pelo menos, um pouquinho da história da ciência sabe que seus métodos fazem uso da observação, dos experimentos, de frustrações e êxitos. Não é mágica. Cientistas não são deuses. Por isso a ciência precisa de tempo. </div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Preparei-me para uma longa travessia. Simples reclusão? Covardia? Não. </div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Apoio à ciência. Os soldados desta guerra. Se não sou uma delas/deles, precisava ser um agente a menos na disseminação. O inimigo é invisível e precisa de corpos para viver. Às vezes não dá sinais. Tem suas estratégias. No combate, existem corpos que precisam se expor. Trabalhadores da saúde, produtores de alimentos e outros serviços essenciais, e aqueles que ganham pela produção diária na rua. Compreendo. Minha reclusão é uma forma de agradecê-los. Respeito o coletivo e submeto a ele o meu ego. Somos seres sociais. Ao longo da história, só como sociedade garantimos a sobrevivência da espécie.</div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">A reclusão não me incomoda. Gosto de estar comigo. De descobrir onde escondo meus medos. De pedir socorro quando preciso. De aprender com a experiência dos outros... e foram tantos que nos doaram relatos, papos, terapias, música, poesia, política.</div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Sim, política! E foram tantas as belas campanhas em uma tentativa de mudar suas aldeias. Afinal é lá que tudo começa, né? E foram tantas as decepções... no entanto, foi interessante observar que os candidatos com apoio declarado (óbvio) do Genocida foram rejeitados em sua maioria. É um alento?</div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Bom seria, se não observássemos os detalhes. Quem foi o grande vencedor? O camuflado. Aqueles que não usaram a imagem do GENOCIDA, mas o apoiam ou recebem dele o apoio “por baixo dos panos”.</div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">É triste observar a miopia daqueles que não fazem a conexão entre as coisas pequenas, que acontecem do seu lado, e as grandes.</div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Pois é... mas a vida não parou. Encontramos no caos algumas rotas, fortalecemos vínculos com o que nos impulsiona. Produzi. Participei de eventos importantes à distância, dos quais teria chances reduzidas de acesso sem essa condição. Poderia até me considerar vitoriosa neste dia, afinal estou viva entre quase 200 mil mortos, e outros tantos que ainda lutam nos hospitais ou em suas casas ou, ainda, outros tantos que tentam adormecer os seus lutos. Todavia isso não é uma competição. Em uma guerra não existe vencedores. Há sobreviventes. Quase sempre marcados por sequelas.</div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Isso tudo é só pra dizer, em letras miúdas, onde se esconde o grande mal. O mal que faz uma pessoa oferecer seu corpo para manutenção de um vírus porque está cansada e tem direito a uma festinha (em que serviçais famintos se expõem por um trocado) é o mesmo que o leva ao voto pra se dar bem momentaneamente. O mal que há séculos sustenta uma sociedade colonial, escravocrata e desigual. </div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Esse é o gerador de todas as crises: o umbigo.</div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">O umbigo nos alimenta em um curto período, quando estamos presos a um útero e não temos condições de andar com as próprias pernas. Só recebe. Nove meses em uma vida que pode durar 960 meses. Durante os quais a cicatriz está lá bem no centro do corpo, impondo-se.</div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Aqui fora, meu bem, estamos conectados a uma teia universal. Retroalimentada. O que você faz me afeta. O que eu faço te afeta. A guerra está só começando. Se não aprendermos isso, não terá data para acabar. </div> <div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><br />Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-36782537054489490932019-07-28T14:57:00.000-03:002020-06-27T16:13:55.177-03:00Ausência<br />
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<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgNaEebGRbcR-AfKAcp5rKTbaIgQW9Sz-bFG0nMOtmIewa0qfsJNOIedi06O_dFC9SYvkerzne7c_qcEldNAi-WMpQcUytlIMpeWoLQ4Hs5FaTXQ1-h55RGrrdD2DTX3YcZszDxa9Dos90/s1600/IMG_4726.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1057" data-original-width="1600" height="263" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgNaEebGRbcR-AfKAcp5rKTbaIgQW9Sz-bFG0nMOtmIewa0qfsJNOIedi06O_dFC9SYvkerzne7c_qcEldNAi-WMpQcUytlIMpeWoLQ4Hs5FaTXQ1-h55RGrrdD2DTX3YcZszDxa9Dos90/s400/IMG_4726.JPG" width="400" /></a></div>
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Sinto falta de estar aqui como eu queria.<br />
<br />
Sinto muito.<br />
Está difícil viver. Está difícil respirar.<br />
As palavras não me abandonam e nelas jogo a minha âncora.<br />
Tenho estado em outras frentes.<br />
Prenhe de arco-íris.<br />
Gratidão imensa aos caminhos que se abrem apesar do nevoeiro, dos raios, da tempestade.<br />
<br />
Se sentirem a ausência, me encontrem na Revestrés, blog Do Caminho:<br />
<a href="http://www.revistarevestres.com.br/blog/sergiaa/">Revestrés/Do Caminho</a><br />
<br />
ou na plataforma literária <a href="https://liberoamerica.com/author/sergiaalveshotmailcom/">LiberoAmérica</a><br />
<br />
<br />Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-15697615047087158612019-04-11T11:32:00.000-03:002019-05-21T13:01:28.148-03:00Dois modos de ouvir os oitenta e uns<br />
<br />
<div style="font-style: italic; text-align: right;">
<i>Então irromperia um novo paradigma, vale dizer, uma nova </i></div>
<div style="font-style: italic; text-align: right;">
<i>consciência </i><i><i>e de acordo </i><i>com ela um novo modo de produção </i></i><br />
<i>
</i></div>
<div style="font-style: italic; text-align: right;">
<i><i>e de consumo </i></i><i><i>que buscaria um acordo com as possibilidades</i></i><br />
<i>
</i></div>
<div style="font-style: italic; text-align: right;">
<i><i>reais da Terra </i></i><i><i>e as demandas sensatas e justas de toda </i></i><br />
<i>
</i></div>
<div style="font-style: italic; text-align: right;">
<i><i>a comunidade de vida, </i></i><i><i>especialmente, dos seres humanos.</i></i><br />
<i>
</i></div>
<div style="font-style: italic; text-align: right;">
<br />
<i></i>
<i>
</i></div>
<div style="text-align: right;">
<div style="display: inline !important;">
<span style="font-size: x-small;">(Leonardo Boff, em entrevista ao portal Ideia Sustentável)</span></div>
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<i><br /></i>
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<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg6U_7f716W-bMrM2GYu_KPwm3jwhutYEeFICYOrYMwCU9diNkSni6j1wISceu0DyVDGziN6Slilq89zCfwiHt-PHI4eWpgnsJl5EWED_GKER6D0XQC89Kf_cVUaedywartzfBq2F3O3_M/s1600/chuva+e+flores.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1596" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg6U_7f716W-bMrM2GYu_KPwm3jwhutYEeFICYOrYMwCU9diNkSni6j1wISceu0DyVDGziN6Slilq89zCfwiHt-PHI4eWpgnsJl5EWED_GKER6D0XQC89Kf_cVUaedywartzfBq2F3O3_M/s400/chuva+e+flores.JPG" width="398" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Chuva e flores no planalto central</td></tr>
</tbody></table>
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<div style="text-align: justify;">
Há alguns dias uma amiga me convidou para ver uma palestra de Leonardo Boff. Larguei tudo. Troquei de roupa rapidamente e fiquei de tocaia no portão como criança à espera de um brinquedo novo. Quando que, nesse tempo dominado pela falsidade e a surdez, eu teria nova chance de ouvir um intelectual desse porte assim de perto?</div>
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<br /></div>
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O auditório estava lotado, mas chegamos a tempo de encontrar um lugar para sentar. Dezenas de pessoas se espremiam pelas laterais. Gente de todas as idades. Mas o que me deixou mais feliz do que ficar acomodada em uma cadeira foi observar a presença animada dos jovens. Aplausos. Muitas palmas e um respeitável senhor de oitenta e um anos, com algumas mazelas pelo corpo, se pôs de pé no meio do palco. Trouxeram-lhe uma cadeira que ele recusou, prontamente, dizendo preferir sentir circular a energia.</div>
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<a name='more'></a><br /></div>
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Com uma firmeza na voz que contradizia seu cabelo branco, Boff fez uma análise profunda e serena da conjuntura política nacional e internacional apontando caminhos para o renascimento da esperança. Fez uma ligeira retrospectiva sobre seus livros e suas lutas, apenas para contextualizar e chamar a atenção para as razões de estarmos hoje diante de um quadro assustador. Na sua visão essa pode ser uma crise definitiva que antecede grandes transformações, de onde não se sairá sem uma ruptura com as forças que sempre nos mantiveram com o pé no freio. </div>
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<br /></div>
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Dias depois um fato me chega pela TV, sem análise da conjuntura. Os conceituados analistas de TV estão surdos. Ainda assim o barulho se impôs como representativo da situação que vivemos nesse instante. A notícia tratava de uma ação do Exército brasileiro contra uma família no Rio de janeiro em um passeio dominical. Oitenta e uns disparos e a execução sumária de um pai de família, que não por acaso era negro e músico. </div>
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<br /></div>
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O fato é simbólico como ato comemorativo dos primeiros cem dias do (des)governo de formação majoritariamente militar, que teve como primeiro ato a extinção do ministério da cultura, que condena abertamente as políticas públicas e ações afirmativas para pessoas de cor e minorias, iniciadas nos últimos anos, e promove um indisfarçável aparelhamento ideológico de extrema-direita no ministério da educação com perseguição a reitores e professores de escolas públicas. </div>
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<br /></div>
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Como não poderia deixar de ser, nem o Governador do Estado (mesmo partido do presidente) e nem as autoridades do Governo Federal (presidente, ministro da Segurança e da Justiça, comandante do exército) condenaram a ação ou assumiram publicamente o erro. O não agir como se espera que líderes de uma sociedade civilizada ajam é sinal claro de que a barbárie ultrapassou o discurso do então candidato, se encorporando às ações de governo. Esse era o grande temor dos que gritavam ELE NÃO durante a campanha eleitoral: que o discurso racista, homofóbico, machista, de ódio ao que diverge contaminasse a sociedade e suas representações. Agora já não é medo ou suposição. É a extensão de uma realidade nua e crua, infelizmente já muita conhecida das periferias das cidades em que o grupo, que chegou a todas as esferas de poder, se fortaleceu.</div>
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<br /></div>
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Salve-se quem puder! Grita para a esposa e o filho, o pai ferido. É o que ouvimos, à distância, no sibilar das balas. E a metáfora não é aquela de que o piloto sumiu, é preciso lembrar. Existe um comando, sim. Estamos sendo comandados por aqueles que acreditam na violência como solução. Na eliminação do que diverge e no apagamento da história. Pelos que entendem a palavra 'ordem' como o silêncio de jovens e obediência de crianças pelo medo. Pelos que substituem desenvolvimento sustentável com inclusão social pelo 'progresso' financeiro dos poucos privilegiados de sempre. </div>
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<br /></div>
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Se a barbárie está instalada, só nos restam as mãos que não se soltam e o calmo pensar dos que esbanjam firmeza apesar dos oitenta anos. É dele o pensamento de que a libertação começa pela consciência de que fazemos parte de um todo cósmico. É essa consciência que nos dá hoje a certeza de que do outro lado somos muitos e somos mais. O pipocar de oitenta tiros tem o poder de assombrar mas também de despertar para a necessidade urgente de renovação da fé em uma ordem justa do mundo. </div>
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<br /></div>
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<br /></div>
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Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-49666654949244050612019-03-02T23:23:00.001-03:002019-03-04T10:18:06.231-03:00Sobre carnaval, ilhas e sinos<br />
<span style="font-size: x-small;"><br /></span>
<i><span style="font-size: x-small;">Nenhum homem é uma ilha, um ser inteiro em si mesmo;</span></i><br />
<div>
<i><span style="font-size: x-small;">todo homem é uma partícula do continente (...)<br />Também a morte de um único homem me diminui, </span></i></div>
<div>
<i><span style="font-size: x-small;">porque eu pertenço à humanidade. </span></i></div>
<div>
<i><span style="font-size: x-small;">Portanto, nunca procures saber por quem os sinos dobram.<br />Eles dobram por ti.</span></i></div>
<div>
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
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<span style="font-size: x-small;">(John Donne, trecho de Meditação XVII)</span></div>
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<span style="font-size: x-small;">(trad. Luis Peazê - como parte de Por quem os sinos dobram de E. Hemingway) </span><br />
<br />
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj_sG-NkUDBpPgl3vZcIO9_mlY1c3Tz-hlx-XHfST7dc4NXM7pa1RbvXivx0EOAVQaRTIDngMRxQF2BDnGOGeFHRYf-xc0G8MV6i3-cswl-1uqpVQY5931esrE-5Arj2lnreO69H1z_37Y/s1600/IMG_1188.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="773" data-original-width="1600" height="308" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj_sG-NkUDBpPgl3vZcIO9_mlY1c3Tz-hlx-XHfST7dc4NXM7pa1RbvXivx0EOAVQaRTIDngMRxQF2BDnGOGeFHRYf-xc0G8MV6i3-cswl-1uqpVQY5931esrE-5Arj2lnreO69H1z_37Y/s640/IMG_1188.JPG" width="640" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">a nuvem, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
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<br /></div>
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Ando escrevendo pouco por aqui. Desmotivada pelo turbilhão de acontecimentos que nos deixam perplexas e apáticas. Ao comentar a bestialidade dos nossos dias, uma amiga me disse hoje que sentia-se como se estivesse mergulhada em um pesadelo, daqueles que não conseguimos acordar. A mesma sensação que se apoderou de mim ao ver o aparato de guerra que cercou a saída do presidente Lula para participar do velório do neto e os comentários dos <i>haters</i> que estão no poder. É isso, pensei me enchendo de esperança de que por mais aterrorizante que seja uma hora ele vai acabar. Afinal essa é a dinâmica natural de um pesadelo. </div>
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<br /></div>
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Muitas outras imagens nos vem à mente em horas como essa, em meio a angústia que a morte de uma criança nos causa. Dormi abraçada com a minha neta de sete anos, agradecendo aos céus pela sua saúde e por ela estar comigo naquela noite, ou por eu estar em condições de abraçá-la. Mas uma imagem se impôs: a de um padre irlandês que foi meu professor no ensino fundamental. Um dia ele entrou na sala e escreveu no quadro a frase de John Donne que hoje me guia, e nos pediu que falássemos a respeito. O que viesse à cabeça diante da afirmação de que <i>Nenhum homem é uma ilha</i>. Só muito depois eu viria a conhecer o texto completo, e o livro de E. Hemingway. A essas alturas não lembro com detalhes, mas sei que na proposta de discussão estava o desejo de nos induzir o pensamento sobre a condição humana, ou o nosso pertencimento àquilo que chamamos humanidade.</div>
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<a name='more'></a><br /></div>
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E tudo isso no dia em que oficialmente começamos o carnaval. Um suposto tempo de alegria. O que me faz lembrar de outro padre que teve um papel fundamental para nosso despertar de outro pesadelo terrível: Dom Hélder Câmara, arcebispo de Olinda. Na sua visão, um tempo de por um pouco de sonho na realidade dura da vida. Nos blocos ou nas escolas de samba há sempre o espaço para extravasar aquilo que nos sufoca. É bem a nossa cara transformar luta em festa, cantar para ter a voz ouvida foi o que nos ensinaram os mestres do samba, do jazz, e mais recentemente do<i> rap. </i>E nas ruas já se escutam os gritos. Assim como vimos da parte dos poderosos a demonstração do receio das reações populares. Não precisa muita esperteza para concluir que todo o aparato de guerra não era precaução contra uma possível fuga de um senhor de 73 anos carregando sobre os ombros uma dor imensa, mas uma profunda insegurança que nasce do medo de que o povo se levante.</div>
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Um avô disse adeus ao seu neto em um ato reverso, em um sábado de carnaval. Os olhos embaçados de tristeza viram a solidariedade dos que entendem que estamos interligados, que nenhum homem é uma ilha encerrada em si mesma. Voltou ao seu cárcere o homem que chora a sua noite solitária. Os sinos dobraram por um menino, que não teve tempo de se dar conta do quanto perdemos de nossa humanidade quando nos isolamos em nossas bolhas. O sino acorda a minha escrita. Talvez, a única forma de evitar pesadelos seja mesmo se manter acordada.</div>
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<br /></div>
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Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-50632303258824427962019-02-01T16:21:00.001-03:002019-02-03T11:09:53.864-03:00Comer é um ato político<br />
<i>Qué es esto preguntamos<br />qué es esto e hasta dónde.<br />El mundo cede vuelve<br />retrocede<br />se borra se derrumba se hunde<br />lejos<br />deja de ser.</i><br />
<div>
<i><br /></i></div>
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(Idea Vilariño, Poesia completa p.191)<i><br /></i><br />
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<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgjenG0kvOLDuKTW6B4d8ikXjwsE1KCfrvo9EmYVNMSWfilXjhey2mjMDFXV_ynrUcQ5ZAiFe511gNKz_36vrlAV7Ph3XLRxMhzCfWrqbHF4GcgvsZIQNNTX9i0fEXqIMYwj08lG1uUyxg/s1600/IMG_E1341.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="852" data-original-width="1283" height="424" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgjenG0kvOLDuKTW6B4d8ikXjwsE1KCfrvo9EmYVNMSWfilXjhey2mjMDFXV_ynrUcQ5ZAiFe511gNKz_36vrlAV7Ph3XLRxMhzCfWrqbHF4GcgvsZIQNNTX9i0fEXqIMYwj08lG1uUyxg/s640/IMG_E1341.JPG" width="640" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">A feira, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
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<br />
<div style="text-align: justify;">
Em uma conversa descontraída sobre alimentação saudável, uma colega de academia me disse que não comprava produtos de assentamentos por conta do "viés ideológico". Era contra invasão de terras. Repetiu palavra por palavra de todo aquele repertório que aprendemos na TV antes das correntes do <i>Whatsapp</i> governarem a nossa vida. Virei o rosto para que ela não percebesse o riso sarcástico. Sou involuntariamente transparente. Já me disseram isso uma vez. Os músculos da minha face reagem e denunciam o meu pensamento para o bem ou para o mal. Oi? e o veneno que você compra no supermercado é isentão? Era o que estava escrito na minha testa, e eu guardei para essa crônica que mergulha na insensatez dos nossos dias. Guardei por cansaço, por puro cansaço e falta de paciência para discussão.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Sim, os primeiros trinta dias de 2019 me deixaram muito cansada. Certamente não foi só a mim. Mais cansados que eu devem estar os professores da rede pública que veem um profeta do obscurantismo se apossar das parcas conquistas de três gerações, ardente do desejo de transformá-las em pó, enquanto seus míseros tostões caem na conta com atraso. Sem projeto para o único caminho que poderia colocar o país em uma trajetória de civilização, nega-se a ciência, a pedagogia, apagando conhecimentos científicos com a justificativa de retirar da educação o viés ideológico. Pergunta-se o que é a ciência, senão o questionamento constante do conhecimento? Como questionar o conhecimento sem conhecê-lo? </div>
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<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Mais cansados que eu devem estar os ativistas de direitos humanos, os defensores das minorias, das comunidades indígenas, dos quilombolas, os que fazem os movimentos anti-racismo e feministas. Deve ser exaustivo acordar nas manhãs com as declarações absurdas da ministra evangélica (e aqui o acento se coloca porque essa é a sua ótica sobre a sociedade) justificando sua imposição bíblica para retirar das famílias o viés ideológico. Por mais que digam que o que ela diz é cortina de fumaça para encobrir algo tenebroso na economia, ela tem poder não apenas na igreja que lhe dá sustentação. Seu projeto é político, e a nossa frágil democracia já demonstrou que os três pilares são vasos comunicantes.</div>
<div style="text-align: justify;">
<a name='more'></a><br /></div>
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Mais cansados que eu devem estar os economistas, os estudantes que se debruçaram sobre tratados de economia, os que escolheram fazer doutorado em mil outras universidades que não a de Chicago-USA. Aqueles que, a exemplo de Thomas Piketty revisam O capital de Marx para entender o caminho da desigualdade e o que a transformação do capital fundiário e industrial dos seus estudos tem a ver com o capital financeiro dos nossos dias e a concentração de renda, para repensar o mérito e a necessidade de taxação progressiva sobre a renda. Afinal o que é a economia, senão o rever constante da emancipação humana? Que valor tem um produto se não existem pessoas com dinheiro suficiente para compra-lo? Que valor tem as cifras anotadas em um banco se o dono delas não pode usufruir? </div>
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Mais cansados que eu devem estar os estudiosos da segurança pública. Aqueles que vararam madrugadas, subiram morros, visitaram presídios, ouviram histórias, correram riscos nas periferias das grandes cidades para entender a origem do grande mal, da desumanização. Aqueles que teorizaram sobre o que pode levar um ser humano a ser capaz de matar por um par de tênis ou um <i>smartphone</i>, sobre a prevenção e o resgate dessas pessoas, ao descobrirem que tudo se resolve com uma arma na mão como nos filmes maravilhosos do velho oeste americano. Afinal o que é segurança senão a certeza de que não há nada a temer quando eu e outro nos vemos da mesma forma, de que o outro não será capaz de me ferir se ele acreditar que eu também não vou machucá-lo?</div>
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Mais cansados que eu devem estar os ambientalistas, os bombeiros e familiares sobreviventes de Brumadinho. Aqueles que fizeram protestos nas ruas, nas assembleias e na câmara federal para que o crime ambiental de Mariana não se repetisse. Repetiu-se de maneira mais cruel no exato momento em que governa o estado alguém que acredita na confiabilidade do mercado e no seu poder de auto-regulação, que defendeu na campanha que se deve confiar nas empresas e liberar o antes, penalizando exemplarmente o depois "se" o erro ocorrer (como se o "se" fosse improvável ou não envolvesse a vida das pessoas). No exato momento que ocupa o Ministério do meio ambiente e a presidência dois defensores da flexibilização das leis ambientais para facilitar o crescimento econômico. Pergunta-se: de onde veio o conceito de sustentabilidade senão da compreensão capitalista (do mercado) de que recursos naturais não são renováveis e que a única saída para a lucratividade seria apoiar-se nos pilares ambiental, social e econômico?</div>
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Sim, eu estou muito cansada. Não dá para acreditar na teoria da burrice, da imbecilidade. Junta-se a isso, talvez (nada me convence que os atuais ocupantes do poder sejam algo acima disso) a esperteza do fascismo. Daqueles que, justamente por serem inteligentes, acreditam que a única forma de derrotar uma ideia é a eliminação, uma vez que o argumento sempre será refutável. E eles não querem correr o risco. Ainda assim levanto cedo e vou para a feira agro-ecológica, compro produtos sem veneno, converso com as mulheres produtoras, aprendo que o tomate cereja natural não gosta da chuva que me faz tanto bem por esses dias, e por isso não estava disponível.</div>
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Voltando à transparência dos meus músculos faciais: sim, eu compro o que é produzido em assentamentos, pelo viés ideológico dos que acreditam que a Terra é um bem de todos, de que o latifúndio improdutivo é coisa de países que não conseguiram superar o feudalismo, mantendo esses princípios no que eles chamam capitalismo que de moderno tem muito pouco. Faço do comer um ato político, porque é o que está ao meu alcance. Quem sabe assim derrotamos o viés ideológico que envenena a sua mesa e lucra na venda do produto brilhante da rede de supermercado, na indústria farmacêutica (que é a mesma produtora do veneno), e na rede de saúde privada que trata o câncer do seu filho.</div>
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Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-12375249297097249312018-12-30T15:53:00.000-03:002018-12-31T10:27:36.906-03:00Pensamentos bobos às vésperas de um ano velho<div style="text-align: justify;">
(Ou pequenas histórias de um mundo louco)<br />
<br />
<br />
<br /></div>
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<i><i>Artigo I.</i></i><br />
<i><i>Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. </i></i><br />
<i><i>São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos </i></i><br />
<i>outros com espírito de fraternidade.</i></div>
<div>
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<br /></div>
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(Declaração universal dos direitos humanos)</div>
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<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIGumLVDS9Emk-uj9DSw0piyY2CF4bS2-8GjxLk7Pu78rnaDCVgVgnqF_5RFx17L93cahyphenhyphenAS00NlW-QfXbypdg_dNyBK-TV0HLlhTNdNj2i7yM1HHDQnKTrt7urUznasXXqXiU_h3Btdo/s1600/estrela.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1439" data-original-width="1600" height="571" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIGumLVDS9Emk-uj9DSw0piyY2CF4bS2-8GjxLk7Pu78rnaDCVgVgnqF_5RFx17L93cahyphenhyphenAS00NlW-QfXbypdg_dNyBK-TV0HLlhTNdNj2i7yM1HHDQnKTrt7urUznasXXqXiU_h3Btdo/s640/estrela.JPG" width="640" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">estrela, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
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Estou dentro de um avião, aguardando a autorização para decolagem e aborrecida por ter esquecido de colocar na bolsa o livro que me salvaria da espera. Voo lotado, como são os voos de dezembro. Ainda assim há duas vagas ao meu lado. O piloto anuncia que teremos um pequeno atraso para aguardar passageiros em conexão. Na fileira atrás de mim, uma família. Pai com ar sério e compenetrado, uma mãe muito loura para disfarçar os fios brancos e uma filha muito jovem. Impossível não ouvir. <i>Os direitos humanos só servem para defender bandidos</i>, gritou o pai. <i>O que são direitos humanos</i>, questionava a filha em tom sereno e desafiador. Ele bradava em alto e bom som aquilo que cansou de ouvir de jornalistas de programas policiais de TV aberta, ressoando as vozes das organizações de direita que plantaram a ideia que levou à morte Marielle Franco e tantos outros ativistas de direitos humanos nesse país marcado pela desigualdade. A cada grito do pai, eu me enervava e me continha a muito custo. A mãe interrompia com <i>um sem brigas, por favor</i>, o que encorajava a filha e me dizia que aquela era uma discussão antiga. A cada argumento da filha, eu respirava fundo e sorria para mim mesma, aliviada.</div>
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O mais interessante dessa ausculta involuntária de sentimentos (deles e meus) era perceber no discurso do pai a referência aos "direitos humanos" como se fossem um agente, uma pessoa, uma organização e não um conjunto de princípios. E repetia a célebre: <i>quando morre um pai de família os direitos humanos não aparece sequer para perguntar como estão passando os familiares, mas se prender um bandido na mesma hora chega lá os direitos humanos para soltar</i>. Ao que a filha argumentava que investigar e prender bandidos era trabalho da polícia e precisava ser feito adequadamente. Se isso não acontecia havia problemas na polícia, na segurança pública e não nos direitos humanos. Ouvia algo mais, tipo: <i>agora esses direitos humanos vão ver o que é bom. Tudo vai mudar!</i> Ao que ela respondia tentando esclarecer que as pessoas que defendem os direitos humanos defendem a dignidade do ser humano que era algo muito mais abrangente. </div>
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A escuta/ausculta foi interrompida, de repente, por uma movimentação estranha. Uma mãe e um comissário carregavam aos berros uma criança de três anos. Os seus assentos eram justamente os que estavam vagos ali do meu lado. Tentaram se acomodar, mas a criança estava irritada e berrava algo como <i>Get out... Get out</i>. Tentando me solidarizar com a aflição estampada no rosto da mãe, me ofereci para ajudar com o cinto e as bagagens de mão. Ela, brasileira, falava com ele em inglês o tempo todo. Dizia palavras doces e cantarolava tentando acalmá-lo. Decolamos. Em determinado momento, entre um berro e outro, notei o seu interesse pelas nuvens na minha pequena janela. Perguntei à mãe se ele queria trocar de lugar comigo para oferecer uma melhor visão daquilo que lhe despertara interesse. Ela concordou e agradeceu me confidenciando que ele era autista e estava extremamente estressado pelas longas horas do voo internacional anterior. Ele ficou lá inteiramente absorto pelo desenho das nuvens, enquanto conversávamos tranquilamente sobre a sua história de coragem e disposição para enfrentar um mundo de barreiras aparentemente intransponíveis. </div>
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<br /></div>
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Aterrisso na minha cidade intrigada com tudo que um voo de duas horas pode proporcionar. Aprendi naqueles minutos, que não vi passar, o quanto a vida é capaz de nos surpreender e de se reconstruir como se o bem insistisse em vencer. A filha de um pai reacionário desceu a escada na minha frente demonstrando com muito altivez o seu ânimo em desconstruir o obscurantismo que nos ataca tão de perto. A mãe aflita revelou na sua história de mulher que saiu do interior do Piauí aos dezoito anos para fazer uma faculdade em São Paulo, que teve os sonhos desfeitos, virou babá de família rica e optou por novos sonhos, ter descoberto que o mundo era muito maior do que a dura realidade que lhe cercou ao nascer. Sem chances no seu pais, como muitos jovens lá por volta do ano 2000, emigrou para Europa, onde conseguiu se profissionalizar, se estabelecer e criar raízes. Ganhou de presente um filho que exigia cuidados especiais, oferecidos pelo Estado em um país civilizado que, apesar de outros tantos problemas, leva muito a sério o respeito aos direitos humanos. Disse-me que, diante das últimas notícias, jamais voltaria a morar no Brasil. Despedi-me, desejando boas festas e um feliz retorno àquela mãe e seu filho.</div>
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Não poderia fechar 2018 sem contar essa história. Quero continuar acreditando que a vida é capaz de se recompor, e que entre um estresse e um alívio encontraremos o caminho. Pelo menos enquanto brilhar a tal estrela que nos ilumina.</div>
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Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-81691270593992856062018-11-03T14:05:00.000-03:002018-11-04T11:43:08.881-03:00Crucifica-o! Crucifica-o!<div>
<i><br /></i></div>
<i>Diante dos horizontes próximos,<br />aflige-se o meu coração.<br />Não sei se é o tempo da chegada,<br />ou sempre o da navegação.</i><br />
<div>
<i><br /></i><span style="font-size: x-small;">(Cecília Meireles, Voz do profeta exilado)</span><br />
<br />
<br />
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg_u3u1yhG82soHLKMrk6UiY9l7VBEzDoHZFOInBIP7w85t0b_rmxJ4c_qgnRgeFf49E8CHdipBR-VPLdZp9TysufEqq2Ulijb0AxEePrl6s65_wTzO6HdTV5XI91XVKDfR4ybryo4B88I/s1600/navegar.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1026" data-original-width="1600" height="409" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg_u3u1yhG82soHLKMrk6UiY9l7VBEzDoHZFOInBIP7w85t0b_rmxJ4c_qgnRgeFf49E8CHdipBR-VPLdZp9TysufEqq2Ulijb0AxEePrl6s65_wTzO6HdTV5XI91XVKDfR4ybryo4B88I/s640/navegar.JPG" width="640" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">A duna antes do mar, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
<br />
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<br /></div>
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Das leituras de 2018, a que me causou maior impacto foi, talvez, <i>O Ministério da Felicidade Absoluta</i>, da indiana Arundhati Roy (2017), feita ainda no início do ano. Leitura difícil e ao mesmo tempo desafiadora e envolvente, daquelas que não se pode largar pela metade. Difícil porque parte do mundo descrito pela autora é aquele que repugnamos, que fazemos de conta que não existe, das pessoas que vivem à margem (no seu país de origem, os pobres, os nascidos em castas inferiores, os transexuais, os guerrilheiros separatistas na Caxemira). Desafiadora pela escolha da narrativa fragmentada para dar conta de uma sociedade estilhaçada. Envolvente porque quanto mais avançamos nas páginas mais compreendemos que seu tema se desloca do particular (a Índia e seus conflitos internos seculares) para o universal, como realidade tão próxima de quem vive os dramas de uma sociedade caracterizada por uma imensa desigualdade social.</div>
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Isso me vem tanto tempo depois porque, diante da realidade dos nossos dias e seguindo um conselho de Harold Bloom, saio à caça de serenidade e sabedoria na fonte que me é mais próxima: a Literatura. Deixo a filosofia e a sapiência cristã (apesar do título, que é apenas uma provocação) para outro momento. Nesse caso, a sabedoria está na delicadeza com que a narrativa harmoniza as vozes diversas desse universo com as vozes do outro onde vivem altos funcionários, políticos, filhos de castas superiores, intelectuais, profissionais liberais. Separados e unificados pela mesma violência, não apenas simbólica. É no corpo conflituoso da personagem central, um hermafrodita com corpo masculinizado e alma feminina, cuja tentativa de transexualidade lhe retira a voz doce e musical da infância para lhe presentear com uma voz rouca que <i>soava como duas vozes brigando uma com a outra</i> (p.40), que se revela a profundidade do conflito social do corpo nação. </div>
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<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
E como isso pode ser uma resposta serena à tristeza dos nossos dias? Bom, a ficção tem o poder de nos retirar por um instante do real que suscita paixões, mesmo trazendo no seu enredo todas as demandas de tais paixões. Ali experimentamos e exercitamos a imaginação como algo que está distante de nós, trazemos para dentro, comparamos, compreendemos aquilo que o calor da paixão e a leitura do real nos impede.</div>
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<br /></div>
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É fato, que a extrema direita tem se fortalecido pelo mundo. Conquista seguidores ancorada no medo que temos do outro, do que difere. Lá fora, a xenofobia. A necessidade de defesa daquilo que se considera pertencer a uma nação contra o inimigo externo, o imigrante ou refugiado. Por aqui como no corpo de Anjum, a personagem de Arundhati, o outro faz parte de nós. Uma parte alijada do corpo nação por séculos e que começava, como a voz alterada de Anjum, a desafinar o coro dos contentes. Segundo pesquisa realizada pela cientista social Esther Solano, o eleitor típico do capitão eleito é um homem branco, de classe média, com ensino superior completo e das regiões sul e sudeste do país. A esse se juntaram os contaminados pelo medo difundido por uma nova arma que não controlamos: as redes sociais. O medo se transforma facilmente em ódio, como produto de uma sociedade que não superou o seu período escravocrata, que mantém um índice altíssimo de desigualdade econômica embasada no racismo, machismo e na violência. É só observar os números de mortes de jovens negros pobres, transgênero e de feminicídio que nos descobrimos como <i>uma criatura viva incapaz de felicidade</i> (p.34).</div>
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<br /></div>
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Por aqui, o ódio contra o diferente, em discurso e prática, se fortalece na política com amplo apoio daqueles que se sentiram preteridos diante das políticas públicas de inclusão social das últimas décadas. Esse ódio dá as mãos à mídia conservadora, empresários retrógrados e ao fundamentalismo religioso que tem um plano de poder, e manipula descaradamente a fé alheia em sua capilaridade por um sub-mundo esquecido. É assim que na possibilidade de escolha por um novo mandamento, repetimos antigos gestos e gritamos: <i>crucifica-o! crucifica-o!</i></div>
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<br /></div>
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Amargamos o fim da democracia e do sonho de um estado democrático de direito que garantiria a emancipação dos que foram esquecidos ao relento ou em cemitérios, como aquele em que Anjum constrói a sua <i>Hospedaria Jannat</i> para abrigar aves velhas que decidem morrer. Talvez, eu pertença ao grupo das aves velhas que não querem morrer. Já disse em outros tempos, que vive em mim uma teimosa esperança. É ela que me diz baixinho, e com uma voz cansada, que haveremos de resistir, ou navegar como diz a poeta que me guia, atravessar dunas e aportar mais fortes.</div>
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<br /></div>
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<br /></div>
</div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-33257119456725909572018-10-31T11:19:00.000-03:002018-10-31T11:20:09.442-03:00Tardes na varanda<br />
<br />
<br />
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhaK5n9u2wrT4V3BAmvjiPhq3FeCiGTPCL2Q64Ox6EZ8RNcJ-ast4uY0w7HwBZIImuhAqprCHr10kfC8TsxCzTnahWZQi2Si7-c0kL8wKnYx7WAxosouTZhuV_HpkO731V23KRreG5uc3Y/s1600/arde.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1600" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhaK5n9u2wrT4V3BAmvjiPhq3FeCiGTPCL2Q64Ox6EZ8RNcJ-ast4uY0w7HwBZIImuhAqprCHr10kfC8TsxCzTnahWZQi2Si7-c0kL8wKnYx7WAxosouTZhuV_HpkO731V23KRreG5uc3Y/s400/arde.JPG" width="400" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">minha cidade, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
<br />
<br />
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">minha cidade arde. ardências de fogo e sol. ardências de pulmão e pele. ardências do verde desbotado. ardências do vapor de suas caldeiras fumegantes. ardências de desamparo. ardências.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">minha cidade arde sob um tempo incinerador de esperanças. instalado além da linha do horizonte.</span></div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-24793653048018192282018-10-22T10:58:00.002-03:002018-10-30T14:25:07.334-03:00A hora incerta<br />
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjSOySUV41-A0XYtn36mo0bIb8AinyOPdi2COnw_GApLLm3KY19kbHDqhyphenhyphenbxB-rGtJbD1nA_Yte3fhPJxYhcdlOmIHDB3CWgN1zJ7T0xlnaPKsgqpYr8_GDrQe8wngjqrPysD16YE0IJX4/s1600/IMG_8971.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1127" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjSOySUV41-A0XYtn36mo0bIb8AinyOPdi2COnw_GApLLm3KY19kbHDqhyphenhyphenbxB-rGtJbD1nA_Yte3fhPJxYhcdlOmIHDB3CWgN1zJ7T0xlnaPKsgqpYr8_GDrQe8wngjqrPysD16YE0IJX4/s400/IMG_8971.JPG" width="281" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">o barco, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<br />
<br />
<span style="font-size: large;">O barco atravessa a escuridão</span><br />
<span style="font-size: large;">a proa em saltos <br />absorvendo na foz as marolas<br />sob o casco o duelo <br />a correnteza do rio e a invasão do mar <br />antes do abraço que dilui no sal as resistências<br />o silêncio contradiz o ronco do motor<br />dizendo das angústias que precedem o alvorecer</span><br />
<div>
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div>
<a name='more'></a><span style="font-size: large;">Ao primeiro sinal de luz<br />um ensaio sobre a devolução das coisas<br />ouvidos e olhos atentos captam silhuetas<br />desviam-se das sombras </span><br />
<div>
<span style="font-size: large;">contando os objetos à mão<br />como se ordená-los trouxesse de volta a consistência<br />como se agrupá-los aguçasse a precisão <br />das cores que a noite engole</span></div>
<div>
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div>
<span style="font-size: large;">No amanhecer </span></div>
<div>
<span style="font-size: large;">atravessado o limbo das incertezas<br />o mundo é palpável outra vez.</span></div>
</div>
<div>
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div>
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-19895349108300353072018-09-30T14:53:00.000-03:002018-09-30T16:35:33.253-03:00O levante das mulheres <div>
<i><br /></i></div>
<i></i><br />
<div>
<i><i><br /></i></i></div>
<i>
Uma rua começa em Itabira, </i><br />
<div>
<i>que vai dar em qualquer ponto da terra.</i></div>
<div>
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div>
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjON9urR4jwgZmGVaJrlpTD9Y6YK5dSLpMFlSTwbSgR4F3WUv-3SVRNJ0T2kB_eP0dgg_K3WGW0uB0AwheHI5yywelbmoUObn7A4irXYcG2COeLzcaQnI9U-IwokL-Jmx2aXHeHCncoeiE/s1600/ele+n%25C3%25A3o.JPG" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><br /></a><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjON9urR4jwgZmGVaJrlpTD9Y6YK5dSLpMFlSTwbSgR4F3WUv-3SVRNJ0T2kB_eP0dgg_K3WGW0uB0AwheHI5yywelbmoUObn7A4irXYcG2COeLzcaQnI9U-IwokL-Jmx2aXHeHCncoeiE/s1600/ele+n%25C3%25A3o.JPG" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><br /></a><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjON9urR4jwgZmGVaJrlpTD9Y6YK5dSLpMFlSTwbSgR4F3WUv-3SVRNJ0T2kB_eP0dgg_K3WGW0uB0AwheHI5yywelbmoUObn7A4irXYcG2COeLzcaQnI9U-IwokL-Jmx2aXHeHCncoeiE/s1600/ele+n%25C3%25A3o.JPG" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"> </a><span style="font-size: x-small;">(Carlos Drummond de Andrade, América)</span></div>
<div>
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
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<br /></div>
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhB4QM_UmRKSPPf6Zf_SanlgkbCTquSmYy-QhsRrM0FhdT62F1JaOm5TZq-8p0n6s9do_jb52lClgqujo8AR61EWJKT1EMhP51EGLCiolxfJ1bbfP6YP8-lnhdtHhhybMltQFn1z-vO-74/s1600/ele+n%25C3%25A3o.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="719" data-original-width="1280" height="358" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhB4QM_UmRKSPPf6Zf_SanlgkbCTquSmYy-QhsRrM0FhdT62F1JaOm5TZq-8p0n6s9do_jb52lClgqujo8AR61EWJKT1EMhP51EGLCiolxfJ1bbfP6YP8-lnhdtHhhybMltQFn1z-vO-74/s640/ele+n%25C3%25A3o.JPG" width="640" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Teresina diz #EleNão, por Edilene Facundes</td></tr>
</tbody></table>
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<br /></div>
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<br /></div>
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<br /></div>
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Vivemos um tempo difícil. Aqui e no mundo. A crise migratória na Europa, a crise de representação norte-americana, a crise política brasileira revelam, de repente, as cores desse tempo que nos sufoca. E nos sufoca porque tendemos a imaginar que o tempo é uma linha reta em direção ao futuro. Imaginamos que o que ele nos trouxe de ruim foi superado e o que ele nos trouxe de bom está assegurado. No entanto, o tempo é indomável e não obedece ao traçado dos homens. Ao contrário, teima em manter um movimento cíclico. Depois de nos oferecer uma revolução nos costumes, e a promessa de uma era de aquários, nos convida a surfar em uma onda de conservadorismo angustiante.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
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Como já disseram os observadores do tempo antes de mim, e eu apenas repito, quem primeiro sofre as consequências das retrações econômicas e dos retrocessos políticos são as mulheres e as minorias. É sobre elas que cai todo o peso. A xenofobia que empurra os reacionários ao poder na Europa nada mais é do que o medo de ver o outro ocupando um lugar que, a principio, era deles. Ninguém questiona de onde vinha o conforto desse lugar, ou se sua construção usou como combustível a vida do outro em guerras sangrentas distantes. </div>
<div style="text-align: justify;">
<br />
<a name='more'></a><br /></div>
<div style="text-align: justify;">
O discurso belicista e sexista que elegeu Donald Trump nada mais é que uma resposta ao medo do desemprego crescente que as crises periódicas do capitalismo geram. É o excedente de mão de obra que mantém a garantia do lucro. É o avanço tecnológico que reduz a necessidade de mão de obra humana com menor instrução. E é nesse excedente que se jogam mulheres e minorias. Por que são menos instruídas? Não, porque na medição de forças perdemos para os resquícios do patriarcado e para o pensamento hegemônico dos que detém o poder. </div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
O conservadorismo e o obscurantismo que se apossou da representatividade política brasileira nos últimos anos nada mais é do que um desejo de retorno a um passado nostálgico, como se a modernidade provocasse um desconforto extremo. Ninguém se pergunta quanto desconforto esse passado desejado causou aos negros, aos pobres, às mulheres, aos gays e aos que professam outras fé. </div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
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Ainda escrevo embriagada pelo que vi e ainda ressoando no ouvido o som dos passos sobre uma tarde excessivamente quente. E o que vi me diz que uma rua começa num ponto qualquer de um país abaixo do Equador e se alarga para o mundo. Uma rua que começa em um grupo em uma rede social que, contradizendo o discurso da "pós-verdade", alimenta e se retroalimenta do clamor dos passos sobre calçadas. Sim, antes de nós, em outras terras elas marcharam e gritaram <i>Me too</i> contra o sexismo e a opressão, mas é aqui no meu solo, às vésperas de uma eleição, que as múltiplas vozes ecoam fragmentando estruturas partidárias e de comunicação tradicionais. </div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Sim, é na minha aldeia que sinto nascer um movimento capaz de dar um salto no tempo. Não estamos dizendo não apenas a um candidato, como pensam alguns. É contra o conservadorismo que conduz aos extremos, é pelo direito de existir e ter vida plena que mulheres e minorias se juntam e cantam #EleNão. Como diz o poeta que hoje me guia, muitas palavras já não precisam ser ditas. Elas cantam melhor do que eu.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
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<br /></div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-86908960443942592152018-09-04T14:11:00.002-03:002018-09-04T14:11:27.033-03:00Crepúsculo<div style="text-align: center;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjW0uHMpwwI7558W0AYYLSZcg8w8lBZsIad6m3SykScMa28Qk460bezTdLG9M9Q9P7jYFgModji_OIK5EUub9zUR_iwOLOcaCMPcarmg_cVNrDxHUcbepGBczrTP-3gVL798Xx1F0WTB94/s1600/crepusculo.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="635" data-original-width="526" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjW0uHMpwwI7558W0AYYLSZcg8w8lBZsIad6m3SykScMa28Qk460bezTdLG9M9Q9P7jYFgModji_OIK5EUub9zUR_iwOLOcaCMPcarmg_cVNrDxHUcbepGBczrTP-3gVL798Xx1F0WTB94/s640/crepusculo.jpg" width="530" /></a></div>
<div style="text-align: center;">
fumaça</div>
<div style="text-align: center;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<span style="font-size: x-large;"><div style="text-align: center;">
era uma tarde de domingo </div>
<div style="text-align: center;">
a tarde se tingiu de morte</div>
<div style="text-align: center;">
de outras tardes</div>
<div style="text-align: center;">
que antes dela ardiam</div>
<div style="text-align: center;">
anunciando o crepúsculo</div>
<div style="text-align: center;">
<br /></div>
</span>Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-35109597119592303942018-07-29T19:36:00.000-03:002018-08-07T13:52:43.052-03:00Azul é a cor da distância<div>
<i><br /></i></div>
<i>All</i><br />
<i>are gone.</i><br />
<i>Now I am learning</i><br />
<i>of where the seed sprouds in the soil,</i><br />
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div>
[Frank Davey, The Arches p.41]</div>
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<br /></div>
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<br /></div>
<div>
<br /></div>
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhT1th9MJ-C4YqGzO1arVPR0bzWK3PNlWLpqMEBL496LSU7c6pVZ4ksoIR2aD_TaGSZcwxPrOYn0k4ncwEqN9iTeiBIR1HaJcn2254dSZoEXCABzrLqHUlS8t_GPHTdQyRKf7e4TS5-kdg/s1600/IMG_7469+%25282%2529.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1200" data-original-width="1600" height="480" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhT1th9MJ-C4YqGzO1arVPR0bzWK3PNlWLpqMEBL496LSU7c6pVZ4ksoIR2aD_TaGSZcwxPrOYn0k4ncwEqN9iTeiBIR1HaJcn2254dSZoEXCABzrLqHUlS8t_GPHTdQyRKf7e4TS5-kdg/s640/IMG_7469+%25282%2529.JPG" width="640" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">voo sobre o azul</td></tr>
</tbody></table>
<div>
<br />
<div style="text-align: right;">
<br /></div>
<div style="text-align: right;">
Para L., que me ensina a ser aprendiz</div>
<br />
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<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Não faço segredo da minha necessidade constante de viajar. Dizem que meu elemento é fogo, portanto preciso de ar. De ares, melhor dizendo. Diversos, fluidos, leves e azul como só o ar sabe ser. Às vezes busco o passado, como fonte inesgotável de luz sobre nossa passagem pelo mundo, para me convencer de que sou resultado de um movimento que está além desta existência efêmera. Desta feita fui em busca de futuro, talvez de um fio de esperança. De mãos dadas com alguém muito jovem que, cansada de ser receptora de meus relatos distantes, queria assumir o papel de protagonista.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br />
<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: right; margin-left: 1em; text-align: right;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg3YoKpBgTHmD6lx0wGFV8ous_hMSguMEwoSIy2fg6ORntTkNPZzcRc_9CahsAw_qBzutCDTDJEjzndv3FQqlQjtPB5triS9o64x-fjuYGgT-8UQK1T2JlIzJS4YOejVkgR1Vw8SFEYwAI/s1600/IMG_7027.JPG" imageanchor="1" style="clear: right; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1200" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg3YoKpBgTHmD6lx0wGFV8ous_hMSguMEwoSIy2fg6ORntTkNPZzcRc_9CahsAw_qBzutCDTDJEjzndv3FQqlQjtPB5triS9o64x-fjuYGgT-8UQK1T2JlIzJS4YOejVkgR1Vw8SFEYwAI/s320/IMG_7027.JPG" width="240" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">cedros </td></tr>
</tbody></table>
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br />
Ela constatou rapidinho que não há nada de glamouroso em arrastar malas em esteiras a milhas e milhas de distância. Apertar-se cheia de náuseas na classe econômica, enfrentar o medo das turbulências, ser examinada com desconfiança nas fronteiras inventadas pelos homens, ter a mochila revistada milhares de vezes, ter o corpo invadido por raio x, justificar o pedido de entrada e explicar, em outra língua, a disposição de voltar rapidamente para o lugar demarcado como seu, como se lugares fossem partes inalienáveis de um corpo e não uma convenção administrativa.<br />
<br />
No entanto, ela viu também que tudo se dilui no vento quando, tendo os pés firmes no chão, deixamos o novo ar invadir os pulmões permitindo ao cérebro o êxtase do olhar inaugural. De ver, de novo, tudo pela primeira vez.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<a name='more'></a><br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
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Como parte do arranjo para nos aproximarmos da vida normal de um país estranho, nos matriculamos em um curso. Ver professores em sala, secretárias fazendo atendimento, e principalmente, conviver com gente das mais diversas origens seria o primeiro passo para entender que, por mais paradoxal que pareça, nossas diferenças nos tornam iguais. A outra parte foi recusar a comodidade de um hotel em troca de bobagens como ir ao supermercado e à padaria, errar na compra do café ou no uso da secadora, pegar ônibus, triturar o lixo orgânico na pia para que seus resíduos entrem no processo de compostagem e adubem o jardim (eu juro que as flores passaram a exibir outras cores). Ou, apenas fugir um pouco do estereótipo do turista que pelas bandas de lá busca paisagens estonteantes e esportes radicais. </div>
<div style="text-align: justify;">
<br />
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<div style="text-align: left;">
</div>
<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: left; margin-right: 1em; text-align: left;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhl16C1OmBRgjWW6u-_ymKCGEnWadytI9yOXaEHO-aFpgphXTyISaxUbeRRyVkX-iKvi7SdF1gpKxMdEWYxfiv6VtBoyBdbBAXWyyN9kjLJIw-O5r_h4dhSG_BLol5pMaIqBjM77GUUSzs/s1600/IMG_6871+%25281%2529.JPG" imageanchor="1" style="clear: left; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1200" data-original-width="1600" height="240" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhl16C1OmBRgjWW6u-_ymKCGEnWadytI9yOXaEHO-aFpgphXTyISaxUbeRRyVkX-iKvi7SdF1gpKxMdEWYxfiv6VtBoyBdbBAXWyyN9kjLJIw-O5r_h4dhSG_BLol5pMaIqBjM77GUUSzs/s320/IMG_6871+%25281%2529.JPG" width="320" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">castelos de pedras sobre as pedras</td></tr>
</tbody></table>
Nesta tarefa contamos com a inestimável ajuda do verão, que se ocupou em estender o tempo curto da passagem. Com um dia de dezoito horas, aproximadamente, das quais mais ou menos seis eram dedicadas às aulas e leituras posteriores, restaram por volta de doze horas, ou seja, um dia inteiro para perambular em bibliotecas públicas, galerias, parques ambientais, bairros charmosos, restaurantes, cafés, sebos, feiras e mercados. Descobrir que nas praias as crianças fazem castelos de pedra e não de areia, e uma empresa privada as ofereceu um mundo fechado (mas de fácil acesso) em que os conceitos básicos das ciências exatas são repassados de forma lúdica e experimental, encantando também os adultos. Tempo suficiente para se perder e se encontrar, cair da bicicleta e levantar, ou simplesmente sentar para fazer companhia às gaivotas e absorver a serenidade de um por do sol sobre o Pacífico.<br />
<br />
<br />
<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: right; margin-left: 1em; text-align: right;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh6KwM9LVOUHc90oGGwl8AeVKVADW3xfyP-ccTVOkO8BLFsjpZejVYURoB2iyYcjB8tT_tW0daOmxoGc9iw9qqDucGFwnghN-EDUrLqAlRLnvD70fapg-8NCXurAeEqSSX36BpUJwM_GO0/s1600/HFYGE4146+%25281%2529.JPG" imageanchor="1" style="clear: right; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1020" data-original-width="770" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh6KwM9LVOUHc90oGGwl8AeVKVADW3xfyP-ccTVOkO8BLFsjpZejVYURoB2iyYcjB8tT_tW0daOmxoGc9iw9qqDucGFwnghN-EDUrLqAlRLnvD70fapg-8NCXurAeEqSSX36BpUJwM_GO0/s320/HFYGE4146+%25281%2529.JPG" width="241" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">por do sol</td></tr>
</tbody></table>
</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
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E o futuro, onde estava? Bom, para quem vem do Brasil afundado em retrocessos e estruturas arcaicas, foi fácil localizá-lo em cada canto visitado. Antes devo dizer que sou do tipo que viaja e não se deslumbra. Gosto do ar mas tenho raízes e vejo muita graça no lugar sem graça em que vivo. Dificilmente me adaptaria ao que eles dizem ser terra estrangeira. Preciso voltar tanto quanto preciso ir. Todavia, penso que na configuração geopolítica atual o Canadá parece estar entre os melhores lugares para nascer. Digo nascer porque ser imigrante neste mundo de espaços demarcados, mesmo naqueles que se orgulham dos seus avanços neste campo, é ser eternamente alguém sem lugar. Preso às comunidades que se desenvolvem em torno das lembranças dos ancestrais como <i>chinatowns</i>, <i>greektown</i>, etc, ou alienando-se para parecer ser o que não é. </div>
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<br /></div>
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<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: left; margin-right: 1em; text-align: left;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEim9JEAL5W9D0wPb4PLwZ3E1MLh1MrJun3cx72LVJw3MFcRLRS_hdjo6TsCZx9X8kYN5dg-Ua3kk8AS2V0_8vM08vojSVafpDdgFUXSlytLIRpeSDmtAFTd6EWcs8gjPoMZ-_dnuSKvXWI/s1600/IMG_7012.JPG" imageanchor="1" style="clear: left; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1200" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEim9JEAL5W9D0wPb4PLwZ3E1MLh1MrJun3cx72LVJw3MFcRLRS_hdjo6TsCZx9X8kYN5dg-Ua3kk8AS2V0_8vM08vojSVafpDdgFUXSlytLIRpeSDmtAFTd6EWcs8gjPoMZ-_dnuSKvXWI/s320/IMG_7012.JPG" width="240" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">literatura indígena</td></tr>
</tbody></table>
Mas, voltando à questão do futuro, foi por lá que vi, a poucos quilômetros do centro da cidade os mesmos cedros que inspiraram a arte de Emily Carr no inicio do século XX, demonstrando o funcionamento da política de preservação ambiental que caminha paralelamente com a indústria da madeira. Foi lá que vi a preocupação com a produção de alimentos orgânicos como meta de saúde pública. Foi na visita à universidade que percebi o respeito à cultura e à inclusão de descendentes de povos nativos. Foi por lá, também, que senti o respeito à identidade de gênero, à educação e à ciência. E, por fim, foi na escola que vi o funcionamento de uma política de integração de imigrantes em sua totalidade, respeitando suas crenças e lhes oferecendo oportunidades de trabalho que não se resumem aos serviços rejeitados pelos ditos "cidadãos naturais" (neste caso descendentes dos colonizadores ingleses ou franceses), como acontece nos países europeus que tive a honra de visitar, por exemplo. </div>
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<br />
<br /></div>
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<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: right; margin-left: 1em; text-align: right;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiEtF-lzei7vP17rQqQWOAIFzzw8-vylojTSGb-OkNlISaSumwDAhtgmsEY5-3RWFRp2_0T8gYmlvRXHvM2CMOOUVqgS7b417W-E97IuA3j_EiNwy5nop87IFmEIqEs9eiWevvhzn6BPbU/s1600/IMG_E7022.JPG" imageanchor="1" style="clear: right; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1062" data-original-width="1600" height="212" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiEtF-lzei7vP17rQqQWOAIFzzw8-vylojTSGb-OkNlISaSumwDAhtgmsEY5-3RWFRp2_0T8gYmlvRXHvM2CMOOUVqgS7b417W-E97IuA3j_EiNwy5nop87IFmEIqEs9eiWevvhzn6BPbU/s320/IMG_E7022.JPG" width="320" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">flores</td></tr>
</tbody></table>
É evidente que nem tudo são flores, apesar de serem belas as flores. Os loucos na rua que o digam, e não são poucos. O que descrevo é apenas uma impressão baseada em uma estadia curta e pode estar embaçada pelo meu desejo de futuro e de mostrar para minha companheira de jornada que outro mundo é possível. Isso me faz lembrar Alain de Botton quando disse que o <i>exótico no estrangeiro pode ser aquilo por que ansiamos em vão em nosso próprio país</i>, suprimindo o "em vão" porque vive em mim uma teimosa esperança.<br />
<div style="text-align: right;">
</div>
<br />
<br />
Sim, penso no tipo de administração e organização interna que valoriza o crescimento das pessoas, como exemplo de futuro. Um futuro que pode emergir do azul da distância e se colocar a alguns passos de nós se retomarmos o caminho de pensar o país como um lugar para todos e não apenas para os que "merecem", por direito divino, o bom do mundo.<br />
<br />
Espalhar sementes parece ser destino do vento.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br />
<br />
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhz7f-ShetbDZy0OzObnYsp7L9TRTVHQJW1MzRTFEop8t2lksohP22YDyxM6H6ZTVoaaia-40xae8xKthYimiyZuFNWr2L1-WQaWj9YizRZmwx1h22TsIiX9pm29v1VVkIocrunSAwayPI/s1600/IMG_0977+%25282%2529.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1067" data-original-width="1600" height="426" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhz7f-ShetbDZy0OzObnYsp7L9TRTVHQJW1MzRTFEop8t2lksohP22YDyxM6H6ZTVoaaia-40xae8xKthYimiyZuFNWr2L1-WQaWj9YizRZmwx1h22TsIiX9pm29v1VVkIocrunSAwayPI/s640/IMG_0977+%25282%2529.JPG" width="640" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">biblioteca pública</td></tr>
</tbody></table>
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
</div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-49592532414872842922018-06-22T14:59:00.002-03:002018-06-23T08:48:05.481-03:00A Literatura entra em campo<br />
<br />
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhwIQ1ZFnQd5tDA0eo8gFqpEOdiwpbuFNBRsdBakiz7SVsV6KNHer0dpe_MfpcQx0U_W2a0VuRVKIo94g0SKixFZr76AQuaLEEGol0E22PTaBsetuTqaI5AHIwdzQzWMPCMp0EhOyuGFOs/s1600/brasila+azul.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="960" data-original-width="1280" height="300" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhwIQ1ZFnQd5tDA0eo8gFqpEOdiwpbuFNBRsdBakiz7SVsV6KNHer0dpe_MfpcQx0U_W2a0VuRVKIo94g0SKixFZr76AQuaLEEGol0E22PTaBsetuTqaI5AHIwdzQzWMPCMp0EhOyuGFOs/s400/brasila+azul.jpg" width="400" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">brasil mergulhado em azul, por Sergia A.<br />
<br />
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
</td></tr>
</tbody></table>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<br /></div>
<br />
Minha ausência por aqui tem razões fortes e gratificantes. Um voo surpreendente que minhas palavras tomaram, por esses dias, até encontrar pouso no site <a href="http://cronicasdacopa.com.br/">Crônicas da Copa</a><br />
<br />
<br />
Sobre o projeto:<br />
<br />
<div style="text-align: justify;">
"Crônicas da Copa é um projeto que vai acontecer durante a Copa do Mundo da Rússia. Todos os dias, serão postadas crônicas sobre as partidas, sobre a torcida e os acontecimentos da competição. Mais do que análises dos fatos, interpretações pessoais com olhares poéticos, humorados e críticos. Aquilo que ninguém viu e também o que todos viram mas ninguém reparou. A paixão do futebol e o prazer da leitura em campo novamente, por 31 dias."<br />
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Estou agradecida e feliz por fazer parte desse time de <a href="http://cronicasdacopa.com.br/autores/">Autores</a></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Se sentirem minha falta por aqui, é só correr lá... tem muita coisa boa!<br />
A página "Outras publicações", deste blog, tem link direto para as crônicas publicadas por mim. Um click apenas. Boa leitura!</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-85929206471545901032018-06-15T10:27:00.003-03:002018-06-15T10:27:38.376-03:00Sobre angústia, lógica e futebol<br />
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhz_V8YFTUPsgG2jY2nFF5utHhtGtNB20fOMMU1n_fMGo7_FRawSGItF60KtO-yR7rF_TaypDNB6RP8GT3ssZ3lwvTLgtI703GUFiJL5cr9HTs-SHLxRbj6k9v4RsM6NK6cocUe9d9e_es/s1600/IMG_0719+%25283%2529.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1067" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhz_V8YFTUPsgG2jY2nFF5utHhtGtNB20fOMMU1n_fMGo7_FRawSGItF60KtO-yR7rF_TaypDNB6RP8GT3ssZ3lwvTLgtI703GUFiJL5cr9HTs-SHLxRbj6k9v4RsM6NK6cocUe9d9e_es/s400/IMG_0719+%25283%2529.JPG" width="266" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">a flor o espinho, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Sabe aquelas horas nervosas que antecedem o jogo? então, perfeitas para visitar palavras e suscitar imagens. Pode parecer ilógico, mas é assim que dou vazão à angústia que o futebol me provoca de quatro em quatro anos. Sim, preciso confessar a heresia que é me afastar de algo tão presente na vida brasileira: não torço por nenhum time de futebol. Local ou nacional. Nunca vi um jogo em estádio e nem sei quanto pesa uma bola de couro. Aliás, nem sei se o couro ainda é matéria prima de uma bola nesse tempo de altas performances guiadas pela tecnologia. No entanto, de quatro em quatro anos visto as cores e sinto um aperto no peito na hora do hino. </div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
O que me salva são as palavras e as viagens que elas me proporcionam. Um exemplo, para que as coisas tomem um rumo mais concreto: antes do jogo começar visito o país adversário, sem sair do sofá. Se já tive a oportunidade de pisar naquele chão, busco palavras e imagens na memória ou na bagagem. Se não, procuro os poetas. Aqui vai outra confissão: tenho a mania de achar que um lugar é também o que se escreve. Do mesmo modo que o espetáculo proporcionado pelo futebol passa a ser um lugar. E nessa lógica meio sem lógica tomo asas. Não pensem que é tarefa fácil. Se o adversário vem do centro a que todos os olhares se voltam e se copiam, expressando-se em línguas cheias de poder como o francês, o inglês, o alemão, o espanhol, o italiano, está no papo. E não me tomem por poliglota. Está no papo porque as traduções abundam. E quando o danado vem do mundo periférico, de culturas invisíveis ou apagadas ainda que falantes oficiais das mesmas línguas? Respiramos fundo e mergulhamos na escuridão, até encontrar um verso que ampare um comentário todo prosa, disfarçado de naturalidade. As rédeas do coração devidamente retesadas tomam um alívio até serem completamente afrouxadas com um grito na hora do gol. </div>
<div style="text-align: justify;">
<a name='more'></a><br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Foi assim que na copa passada, diante da maledicência política e dos xingamentos que até hoje me envergonham, vesti azul e enfeitei as janelas de bandeirolas para ler Otávio Paz preenchendo uma página em branco com tinta verde. Isso me ajudou a engolir o grito que ficou indo e vindo na garganta de um jogo sem gols. E, em outro momento, encontrei o Samba Makossa estreitando relações entre Chico Science e o grande Manu Dibango da República de Camarões, para me manter inteira depois de ver a rede balançar tantas vezes. E segui até topar com o humor sarcástico do poeta Kurt Bartsch que, com seu estilo telegráfico, mandava um recado preciso sobre o futebol naquele dia que me envergonhou tanto quanto os xingamentos. Perfeito para o desânimo geral de hoje: <i>A casa queimou até os alicerces. E o que/ Fez o humanista? / Estendeu o dedo e escreveu/ Na cinza fria: Nunca mais. / Ah, se ao menos tivesse vertido a / Sua água na casa em chamas. </i></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Às vésperas de outras horas nervosas aqui dentro e um pano de fundo tão vergonhoso quanto o sete a um que nos assombra, dou início ao ritual e ouço uma voz que me diz que futebol não é causa e nem cura de nossas mazelas. Antes, parece ser um jeito de estimular o prazer de sonhar outros mundos. </div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-57001808297004163772018-04-17T10:14:00.003-03:002018-04-17T10:14:31.361-03:00Oficina de microcontos II: Inverno<br />
<div style="text-align: right;">
<br /></div>
<div style="text-align: right;">
<i>Ela quer um amor simples</i></div>
<div style="text-align: right;">
<i>feito café da manhã</i></div>
<div style="text-align: right;">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div style="text-align: right;">
<span style="font-size: x-small;">[Zack Magiezi, notas sobre ela]</span></div>
<div style="text-align: right;">
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div style="text-align: right;">
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div style="text-align: right;">
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div style="text-align: right;">
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgVGEgmUVhLKhysvajoUAFYaynuWau4oxvqzpx-JFlH3Dc56_goxkmiqxLQlzyl04-UN3Kcsg8Q9kUxY7aYkT24KrTBBdSXh2JknOYj7lIaXuKmb9VB6cabek0GWdG8KM3jAsjd_dnl6MM/s1600/IMG_4799.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1097" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgVGEgmUVhLKhysvajoUAFYaynuWau4oxvqzpx-JFlH3Dc56_goxkmiqxLQlzyl04-UN3Kcsg8Q9kUxY7aYkT24KrTBBdSXh2JknOYj7lIaXuKmb9VB6cabek0GWdG8KM3jAsjd_dnl6MM/s400/IMG_4799.JPG" width="272" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">janela congelada, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<span style="font-size: x-large;"> O café! (manchas na janela).<br /> ...esfriou.</span><br />
<div>
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div>
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-19555837114792088992018-04-14T20:26:00.000-03:002018-04-14T20:36:58.578-03:00Oficina de microconto<br />
<br />
<div style="text-align: right;">
<i>For sale: baby shoes. Never worn</i> </div>
<div style="text-align: right;">
<br /></div>
<div style="text-align: right;">
[Ernest Hemingway, a six word novel] </div>
<br />
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEipWv59X1miPcW9-aakf-jrcoJP6FlAZGh9W9gXf8kWMw1HsjnZDRAYzFHv7NLFCMRZk6lysDw6Ck0dNssg62XHojKTyIkaj_j0NA7lECB-yRf_Y1qpWGKNy7mL94g9ZZFrCo97EYzSAoY/s1600/IMG_0488+%25284%2529.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="984" data-original-width="1600" height="392" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEipWv59X1miPcW9-aakf-jrcoJP6FlAZGh9W9gXf8kWMw1HsjnZDRAYzFHv7NLFCMRZk6lysDw6Ck0dNssg62XHojKTyIkaj_j0NA7lECB-yRf_Y1qpWGKNy7mL94g9ZZFrCo97EYzSAoY/s640/IMG_0488+%25284%2529.JPG" width="640" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">flores na margem, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
<br />
<br />
<span style="font-size: large;">Deram-me três palavras: </span><span style="font-size: large;">Lago é profundo</span><br />
<div>
<span style="font-size: large;">rabisco outras três: </span><span style="font-size: large;">Vago pela margem.</span></div>
<div>
<span style="font-size: large;">leio, ao comando.</span></div>
<div>
<span style="font-size: large;">poético! ouvi<br />deve ser o que sou.</span><br />
<div>
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
</div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-46623453543848560062018-04-07T14:32:00.000-03:002018-04-08T23:15:44.993-03:00Liberdade, liberdade<br />
<br />
<i>Aproveita hoje, seu coração em festa<br />Amanhã<br />vai que a vida desembesta.</i><br />
<span style="font-size: x-small;"><br /></span>
<span style="font-size: x-small;">[André Gonçalves, Bandeirolas - Pequeno Guia das Mínimas Certezas]</span><br />
<br />
<br />
<br />
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhKr3BSk3DeRCA1rN16Yt9HsmP10Euitq7m0dha7NcvlF-fid6vBbZdPdJvBx3d4PXJIj9SQK_3ggOHbegtvrZGjFCiQg3rZ8TXdtOg95gZ-b7VzSlgzIO25Untlu5szSVA5rAw4tyHgQQ/s1600/IMG_4539+%25284%2529.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1012" data-original-width="1600" height="404" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhKr3BSk3DeRCA1rN16Yt9HsmP10Euitq7m0dha7NcvlF-fid6vBbZdPdJvBx3d4PXJIj9SQK_3ggOHbegtvrZGjFCiQg3rZ8TXdtOg95gZ-b7VzSlgzIO25Untlu5szSVA5rAw4tyHgQQ/s640/IMG_4539+%25284%2529.JPG" width="640" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">sob o sol, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
<br />
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Comecei a escrever este texto no dia em que o principio da Liberdade, estabelecido na Constituição de 1988, perdeu um grau na escala garantida pela Lei. A minha intenção era discorrer sobre o tema. Escrever como um exercício que me permitisse entender por que esse, que foi um bem tão precioso naquela década, agora se torna algo negociável e que pode se colocar abaixo de outros bens como a propriedade, como a moral messiânica de grupos, ou, simplesmente, como algo banal que perdeu o significado.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Fui atropelada pelos acontecimentos que se seguiram à madrugada que dividiu os dias 04 e 05 de abril. Achei por bem esperar a poeira assentar para que o pensamento me saísse organizado e sem precipitação. Pois bem, estou aqui na madrugada que absorve a desobediência civil do ex-presidente, como dizem muitos, e o meu sono não vem. Fico imaginando os que estão lá, neste momento. Milhares de brasileiros vigiando um sono ainda liberto, se é que esse também não deu as mãos ao meu e saíram por aí a passear.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Não discuto o tal processo, nem os procedimentos jurídicos e midiáticos e muito menos o caminho escolhido pelo ex-presidente. Também não discuto, neste instante, os erros da esquerda no poder (já fiz isso em outras ocasiões). Primeiro por não ser jurista, e segundo porque isso é o que menos importa neste instante. A questão principal está no que o vento vem soprando nos últimos anos, moldando ondas lentamente, ora frágeis ora impetuosas. Desde as manifestações inexplicadas de 2013, passando pela instabilidade econômica e política de 2014 e 2015 insufladas por uma operação anti-corrupção seletiva e com objetivo, hoje, muito claro. Até o afastamento de uma presidenta, que não cometeu crime durante o mandato, e implantação de uma agenda neoliberal, financista e completamente voltada aos interesses do mercado. Ou seja, a questão principal parece ser a necessidade de decifrar do caos, uma pista sobre o que o futuro nos reserva.</div>
<div style="text-align: justify;">
<a name='more'></a><br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Nesse ínterim, chegou até mim o resultado de uma pesquisa desenvolvida por um grupo coordenado pelo economista francês Thomas Piketty, publicada em dezembro de 2017, que aponta no nosso amado país a maior concentração de renda em 1% da população, em comparação com outros países. Segundo seus dados, os milionários brasileiros estão à frente dos milionários do Oriente Médio. Se o recorte for de 10% da população, aí perdemos para o Oriente Médio, mas nos igualamos à Índia e ficamos acima da África Subsaariana. O que isso quer dizer? No mínimo que, em um país em que dois séculos de independência não foram suficientes para desfazer a visão colonialista e escravocrata de sua sociedade, há algo muito errado. Um país que não entende que o seu capital principal está no desenvolvimento das pessoas independente da sua origem, cor, gênero, orientação sexual, permanece assentado em algo muito errado. Um país que não entende que a liberdade dos seus cidadãos é um bem primordial, capaz de engrandecê-lo como nação, permanecerá mergulhado em algo muito errado. </div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
É estarrecedor ouvir de políticos e jornalistas conservadores que os treze anos de governo progressista (os únicos em 518 anos, pasmem!) são responsáveis pela divisão do país. Não. Não são. O país está dividido, há séculos, pela desigualdade social. Os tais treze anos foram apenas suficientes para que a parte esquecida, que é maioria, descobrisse que tem direitos, que pode se alimentar adequadamente, que pode ter um emprego formal, que pode discutir com os patrões o valor do serviço doméstico prestado, que pode sonhar para seus filhos um futuro diferente de seus ancestrais. Engana-se quem imagina, simploriamente, que o que vemos hoje se resume à idolatria a um líder populista. O que as pesquisas de intenção de voto indicam, de fato, é o desejo de ascensão, é o desejo de oportunidades que se tornaram palpáveis e são canalizados na voz desse líder.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Mas voltando ao ponto que me levou à tela em branco, é também estarrecedor ouvir dos opositores ditos liberais, ainda que sob o manto do <i>Liberal Conservative</i> inglês, o regozijo pela perda de um direito constitucional. Um direito que garante a liberdade que dizem estar na base do seu pensamento. É estarrecedor perceber que um princípio tão caro possa ser negociável dentro de sua lógica mercantilista de visão curta. O que nos aguarda no futuro, se abrimos mão de garantias individuais em nome de um discurso moralista que prepara o caminho para governos ditatoriais de direita, de esquerda ou teocráticos? </div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Já se foi a metade do dia seguinte. Ligo novamente os canais de TV alternativos que pipocam na internet minando o discurso hegemônico da mídia tradicional. Vejo o grande líder do povo assumir sua condição de prisioneiro, vítima, neste instante, da redução do princípio Constitucional, mas levado nos braços do povo. Uma imagem que toca o coração. Mesmo dos que, como eu, não o tem como um herói. Dos que conseguem separar, com clareza, os erros e os acertos. Esses inegáveis, é preciso reafirmar. É difícil viver este momento. Recorro à poesia que tem me salvado ao longo da vida. Se é preciso seguir com o coração em festa, vamos de mãos dadas, antes que a vida desembeste.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: center;">
<i>Não serei o poeta de um mundo caduco</i></div>
<div style="text-align: center;">
<i>Também não cantarei o mundo futuro</i></div>
<div style="text-align: center;">
<i>Estou preso à vida e olho meus companheiros</i></div>
<div style="text-align: center;">
<i>Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças</i></div>
<div style="text-align: center;">
<i>Entre eles, considero a enorme realidade</i></div>
<div style="text-align: center;">
<i>O presente é tão grande, não nos afastemos</i></div>
<div style="text-align: center;">
<i>Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas</i> </div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: center;">
<span style="font-size: x-small;">(Carlos Drummond de Andrade, Mãos Dadas)</span></div>
<div style="text-align: center;">
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div style="text-align: center;">
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div style="text-align: center;">
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<iframe allowfullscreen="" class="YOUTUBE-iframe-video" data-thumbnail-src="https://i.ytimg.com/vi/fWwxOHqUt8E/0.jpg" frameborder="0" height="266" src="https://www.youtube.com/embed/fWwxOHqUt8E?feature=player_embedded" width="320"></iframe></div>
<div style="text-align: center;">
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-69682407040861228512018-03-18T14:14:00.001-03:002018-09-11T11:32:42.327-03:00Os números e as vozes<div class="separator" style="clear: both; text-align: left;">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: left;">
[para marielles]</div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjVJhikwH-0NHUo-unm06UZ3rZ6kHcjrAtSzk9NsRP-0sZULuzX32VaQzCXmi5CXYkOTOmDWQ0cdWcI39n8dcvc3mvMshILxVJEIbQ1TZoV7Ln9ymGHRbAIFsi4bQlzFvAV6qXkXjrVqaw/s1600/IMG_4258.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1200" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjVJhikwH-0NHUo-unm06UZ3rZ6kHcjrAtSzk9NsRP-0sZULuzX32VaQzCXmi5CXYkOTOmDWQ0cdWcI39n8dcvc3mvMshILxVJEIbQ1TZoV7Ln9ymGHRbAIFsi4bQlzFvAV6qXkXjrVqaw/s400/IMG_4258.JPG" width="300" /></a></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
flores sob o sol, por Sergia A.</div>
<br />
<br />
<div style="text-align: right;">
<i><br /></i></div>
<div>
<br />
<div style="text-align: left;">
<span style="font-size: large;"> frágeis, por assim dizer</span></div>
<span style="font-size: large;"></span><br />
<div style="text-align: left;">
<span style="font-size: large;"> dormem em leito</span><br />
<span style="font-size: large;"> ressequido pelo ardor</span><br />
<span style="font-size: large;"> do número incontável de lúmen</span><br />
<span style="font-size: large;"> balanceando entre sombras</span><br />
<span style="font-size: large;"> o molde a forma</span></div>
<span style="font-size: large;">
</span>
<br />
<div style="text-align: left;">
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<span style="font-size: large;">
</span>
<br />
<div style="text-align: left;">
<span style="font-size: large;"> fortes, por assim dizer</span></div>
<span style="font-size: large;">
</span>
<br />
<div style="text-align: left;">
<span style="font-size: large;"> </span><br />
<span style="font-size: large;"> despertam em meio</span><br />
<span style="font-size: large;"> aos raios, esplendor</span><br />
<span style="font-size: large;"> audível mesmo em baixo volume</span><br />
<span style="font-size: large;"> absorvendo o fluxo infinito</span><br />
<span style="font-size: large;"> que alimenta a vida a morte</span></div>
<span style="font-size: large;">
<div style="text-align: left;">
<br /></div>
<div style="text-align: left;">
<br /></div>
</span></div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-38996942609601951652018-03-08T18:13:00.000-03:002018-03-09T16:31:36.194-03:00Entre montanhas e flores: as dores<br />
<div style="font-style: italic; text-align: right;">
<i>I've learned that even when I have pains, </i></div>
<div style="font-style: italic; text-align: right;">
<i>I don't have to be one.</i></div>
<div style="font-style: italic; text-align: right;">
<i><br /></i></div>
<div>
<div style="text-align: right;">
[Maya Angelou, poeta americana]</div>
<div style="text-align: right;">
<br /></div>
<div style="text-align: right;">
<br /></div>
<div style="text-align: right;">
<br /></div>
<div style="text-align: right;">
<i>Cada morte de um jovem negro tem por trás uma mãe, uma irmã,</i></div>
<div style="text-align: right;">
<i> uma companheira, uma família. As mães aparecem no momento</i></div>
<div style="text-align: right;">
<i> em que sai a notícia e depois elas ficam sozinhas com suas dores.</i></div>
<div style="text-align: right;">
<br /></div>
<div style="text-align: right;">
[Nilza Iraci, Geledés - Instituto da Mulher Negra]</div>
<div style="text-align: right;">
<br /></div>
<div style="text-align: right;">
<br /></div>
</div>
<br />
<br />
<div>
<div style="text-align: justify;">
O telefone toca. Assusto-me como é de praxe. Aborreço-me por atender ao seu chamado estridente. Inquietante, como a urgência que insinua. Do outro lado uma voz serena me diz que recebeu uma rosa branca na subida do ônibus, logo que pisou no asfalto. Um capitão em trajes camuflados lhe desejava um dia feliz. Um dia feliz, ela repetia... um dia feliz... Acomodei minhas dores em água morna, para ceder lugar ao tamanho daquela voz. Depois de um café, lembrei que era oito de março. Escrevi:</div>
<br />
<br />
<br />
<div>
<div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiZ3XOam4DvVmKXbWFbFC8KSR1a99dVsNERUmpA8S7J4gtfAEdNInlmifj02e2UsdMmVQOqvQoZKVgvmSo98XgXLwyMCywcHQqOHsUpdQdl_RaU3iRm1XfJk1y4hy-4Xt4XwC3t4LCI638/s1600/IMG_0486+%25283%2529.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="946" data-original-width="1600" height="378" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiZ3XOam4DvVmKXbWFbFC8KSR1a99dVsNERUmpA8S7J4gtfAEdNInlmifj02e2UsdMmVQOqvQoZKVgvmSo98XgXLwyMCywcHQqOHsUpdQdl_RaU3iRm1XfJk1y4hy-4Xt4XwC3t4LCI638/s640/IMG_0486+%25283%2529.JPG" width="640" /></a></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
uma flor amarela, por Sergia A.</div>
<br />
<br />
<span style="font-size: large;"></span><br />
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">a dor que dói não é dor de parto, que vem e vai e desaparece na expulsão. a dor que dói é a dor macerada em doses repetidas de não.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<a name='more'></a><span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">o não que dói não é o anunciado em voz grave, ainda que dissonante. o não que dói é o não marinado em silêncio ácido e gotejante.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">o não que dói se embala no aroma dos sussurros repetidos e, sutilmente, subverte a dor da expulsão.</span></div>
</div>
</div>
</div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-66892510088516436082018-02-18T00:00:00.000-03:002018-04-12T16:52:18.040-03:00Cartas da Itália: as oliveiras<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<br /></div>
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiNXl39rD2Fwte2UggPoK9FUGox-cIDtFrchLaI9RpkrtLwAbxeB1_p5zV1us0FPfj8n_KPCwQLkeHv3LOML4CA1iVLB2y1bwkWq2EmUD-IewAELY26vMiFioGWiguKsjSVgwnUo0rWmZw/s1600/IMG_0883+%25284%2529.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="998" data-original-width="1600" height="396" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiNXl39rD2Fwte2UggPoK9FUGox-cIDtFrchLaI9RpkrtLwAbxeB1_p5zV1us0FPfj8n_KPCwQLkeHv3LOML4CA1iVLB2y1bwkWq2EmUD-IewAELY26vMiFioGWiguKsjSVgwnUo0rWmZw/s640/IMG_0883+%25284%2529.jpg" width="640" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">um fruto, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
<br />
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">Querida L.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">Teu nome já não carrega a grafia do sangue pela miscigenação incorporada. Assim como não carrega a grafia dessa, apagada pelas convenções que a história nos impôs. É sobre isso que penso ao ceder ao cansaço e me sentar, por acaso, em frente a ela em uma tarde de outono do outro lado do mundo. Vejo meus ancestrais, me vejo, te vejo, vejo o que virá depois em narrativas do tempo. Tenho à mão uma câmera e um bloco que tornam o rabisco inevitável:</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<a name='more'></a><br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhShXIQOiHcgz1m3Yn5LTiO_8wsF9jZvdhWLAcOt7dNhyphenhyphenF4knuJC1m9yBoDeTROdoZxoNKpb4DCbqkcOzbkC6Hov6SVE2lrtOXtqozdu4lKbE3kJvWhmkj_1GG_26a2af3VlmWCnMjMeFs/s1600/IMG_2397+%25283%2529.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; display: inline !important; float: right; font-size: x-large; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em; text-align: center;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1394" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhShXIQOiHcgz1m3Yn5LTiO_8wsF9jZvdhWLAcOt7dNhyphenhyphenF4knuJC1m9yBoDeTROdoZxoNKpb4DCbqkcOzbkC6Hov6SVE2lrtOXtqozdu4lKbE3kJvWhmkj_1GG_26a2af3VlmWCnMjMeFs/s400/IMG_2397+%25283%2529.jpg" width="347" /></a></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">o tronco se retorce </span></div>
<div style="text-align: justify;">
</div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">na brutalidade da vida</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">longeva sob o sol</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">prosperidade milenar</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">vencida a heroica distância</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">que o solo coloniza</span><br />
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">retorcidos são também</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">os galhos novos</span><br />
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">assim serão os frutos</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">olea, erawa, oliva</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">assim são os nomes</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">nascidos da terra</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">e das mãos nos campos</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">ou o que restou deles em nós</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">beijos!</span><br />
<span style="font-size: large;">tua</span><br />
<span style="font-size: large;">S.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
[P.S.: desculpa, esta se guardou por dois anos e alguns meses... e te vai de presente de aniversário!]</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-1229562625733605692018-02-14T14:51:00.001-03:002018-02-14T16:09:20.081-03:00A vida lamentará por nós dois<br />
<i>Senhor eu não tenho a sua fé, <br />e nem tenho a sua cor<br />Tenho sangue avermelhado<br />O mesmo que escorre da ferida<br />Mostra que a vida se lamenta por nós dois<br />Mas falta em seu peito um coração<br />Ao me dar escravidão e um prato de feijão com arroz</i><br />
<span style="font-size: x-small;"><br /></span>
<span style="font-size: x-small;">[Claudio Russo, Moacyr Luz, Aníbal, Jurandir </span><br />
<div>
<span style="font-size: x-small;">e Dona Zezé in samba-enredo da Paraíso de Tuiuti, 2018]</span></div>
<div>
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div>
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div>
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgzfkOl9gckV1xXe9pA6z2_oLHxo1DMVfPiEpAmwngk03OtsokgsBXWP_IWEFNvWJzlRMAEJ875M4FzH7JOT_bX6WCCNsNGkDm3oi8RPtw3zie36L4d_E2bUS1wkqV3IW30ZuRX5nuQn10/s1600/IMG_3673+%25282%2529.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1200" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgzfkOl9gckV1xXe9pA6z2_oLHxo1DMVfPiEpAmwngk03OtsokgsBXWP_IWEFNvWJzlRMAEJ875M4FzH7JOT_bX6WCCNsNGkDm3oi8RPtw3zie36L4d_E2bUS1wkqV3IW30ZuRX5nuQn10/s400/IMG_3673+%25282%2529.JPG" width="300" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">carnaval, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
<div>
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div>
<span style="font-size: x-small;"><br /></span>
<br />
<div style="text-align: justify;">
É difícil escrever na quarta-feira de cinzas, convenhamos, mas é preciso cantar, entre restos de confetes e serpentinas, as reminiscências: em frente à TV com uma chuva torrencial lá fora, eu só conseguia gritar genial! genial! genial! desliguei... não queria ver ou ouvir mais nada, aquelas imagens me bastavam. Serenei, consegui dormir, tranquila, com um alívio na angústia que me persegue não sem antes anotar, eufórica, alguns rabiscos.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: right; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><br />
<br />
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh7VO8Ukk3H4FDyt-WYb9v19cQcphxengVnhV1A3wqMJzKyz-G7TPOLitXhoy4BNrqPcotKe-UnXwNayJ0La8Wm_lml42eYN_ZlfGp611RQxNtv-lTng1nEnlFiuORFfigYMWmPezHOV9c/s1600/tuiuti+2.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1067" data-original-width="1600" height="265" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh7VO8Ukk3H4FDyt-WYb9v19cQcphxengVnhV1A3wqMJzKyz-G7TPOLitXhoy4BNrqPcotKe-UnXwNayJ0La8Wm_lml42eYN_ZlfGp611RQxNtv-lTng1nEnlFiuORFfigYMWmPezHOV9c/s400/tuiuti+2.jpg" width="400" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Dona Zilá na saída de sua casa no Morro do Tuiuti. Foto: Mídia NINJA</td></tr>
</tbody></table>
<div style="text-align: justify;">
Acordo bem. Olho pela janela a cidade que ainda deixa escorrer a chuva. Mudou algo em nossa realidade? Não, aparentemente. No entanto algo me diz que não estou só, que muitos se esforçam e compreendem as raízes da nossa divisão, do nosso eterno futuro distante. E como é gratificante perceber que aquele povo na arquibancada do sambódromo, e nos termômetros enlouquecidos das redes sociais entende que somos um país historicamente dividido. Sim, ultrapassamos a desonestidade manipulatória que tentou levar aos ingênuos a ideia de que nos dividíamos entre coxinhas e mortadelas... E que bom que isso vem pela arte. A criatividade carnavalesca nos mostra que estamos além... muito além na compreensão da perpetuação dos valores de uma sociedade escravocrata que, por puro conservadorismo, não aceita nenhum sinal de mudança.</div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<a name='more'></a><br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Daí, talvez, vem a minha tranquilidade e confiança na sabedoria popular. O carnaval me diz, que de pouco valeram as capas raivosas das grandes revistas, os discursos inflamados dos que se julgam deuses, o ataque frontal à democracia e à soberania popular patrocinado pela elite financeira... porque o que nos toca de verdade é o que toca o fundo da alma. Aquilo que se reconhece em pontos nevrálgicos do nosso corpo, nas histórias que ninaram nosso sono inocente. Sim é desse fundo místico, sagrado, do balanço miscigenado do meu corpo que consigo enxergar a genialidade de um carnavalesco, sua equipe e foliões que mostram com a simplicidade dos não eruditos que o mal que se interpõe no nosso caminho está na exploração do homem pelo homem que carregamos dos nossos ancestrais e não conseguimos dela nos libertar. Abolimos uma forma de escravidão mas criamos outra adequada a cada tempo, sob os aplausos do progresso, em uma espiral que sabemos onde vai dar, diria Marx.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Então, se optamos pela visão separatista (o inferno é o outro, diria Nietzsche) e de permanência desse modelo perverso de desigualdade vale perguntar: quem ganha? quem perde? Vale sugerir uma resposta: a vida lamentará pelos dois.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
</div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-64689496470044593382018-01-26T21:05:00.000-03:002019-01-09T09:33:32.130-03:00O apartamento<br />
<br />
<i><br /></i>
<br />
<div style="text-align: right;">
<i><i>A imaginação tem todos os poderes: ela faz a beleza, </i></i><br />
<i><i><i>a justiça, </i><i>e a felicidade, que são os maiores </i></i></i><i><i><i><i>poderes do mundo.</i></i></i></i><br />
<span style="font-size: x-small;"><br /></span>
<span style="font-size: x-small;">Blaise Pascal (1623-1662)</span><br />
<span style="font-size: x-small;">(matemático, físico, inventor, filósofo e teólogo católico francês)</span></div>
<div>
<span style="font-size: x-small;">
</span></div>
<div>
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div>
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div>
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div>
<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div>
<br />
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgvorxOLgpLItE6D2g2EOJDdw-bDSjPFUDgQxywk6D_L5qUonELUBA_BQE-ajI4oFQ1tGDTSLJUlRjwOUBlbigJG-LPXzrWAMLR1eJo_CqlQO35JLfo1DpT1MxW9qjxrHM5ITR9MBlv3HU/s1600/IMG_0163+%25283%2529.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1057" data-original-width="1600" height="419" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgvorxOLgpLItE6D2g2EOJDdw-bDSjPFUDgQxywk6D_L5qUonELUBA_BQE-ajI4oFQ1tGDTSLJUlRjwOUBlbigJG-LPXzrWAMLR1eJo_CqlQO35JLfo1DpT1MxW9qjxrHM5ITR9MBlv3HU/s640/IMG_0163+%25283%2529.JPG" width="640" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Ao frio ao vento, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
<br />
<br />
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Já passava da meia-noite. Larguei a biografia de Blaise Pascal em um canto da poltrona e fiquei ali tentando agarrar o sono. Esses estudos de matemáticos medievais me tiravam o fôlego por alimentar, em demasia, a minha imaginação. Aliás, tinha acabado de ouvir dele as palavras que ora uso como epígrafe, mas o que eu queria era apenas o poder de dormir. Sabe aquele interstício, aquela zona estreita, quando você não está lá e nem cá? Pois era exatamente ali que eu me encontrava quando o telefone tocou. Meu corpo tremeu levemente diante da indecisão. Deveria atender ou não? No peito uma sensação terrível de que o meu equilíbrio estava por um fio. Àquela hora só poderiam ser duas coisas: má notícia ou uma tentativa do já manjado golpe do sequestro. Preparei-me para a segunda possibilidade. Se ouvir choro, não pronunciarei o nome dos meus filhos. Ainda atordoada atendi.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<div style="text-align: justify;">
- Amiiiiiiga! que bom que tu ainda não estás dormindo! estou precisando muito falar contigo!</div>
</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Foi o sinal para que o tremor tomasse conta de todo o corpo e me levasse rapidamente para a primeira opção. Só isso faria uma pessoa fina, criada e educada no Sul, ligar de tão longe àquela hora da noite. Só me restava engolir seco, respirar fundo, acalmar a voz e dizer:</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
- pois não, querida! cê sabe que pode contar comigo em qualquer circunstância!</div>
<div style="text-align: justify;">
- lembra daquele apartamento aqui no Paraná, ali em Guaratuba, que...</div>
<div style="text-align: justify;">
- a par ta men to? </div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Soletrei cada sílaba sem conseguir disfarçar minha irritação.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
- sim, guria. Aquele que me ofereceram e fomos visitar por duas vezes... mas a construtora ainda estava reformando, prometendo mundos e fundos para me conquistar?</div>
<div style="text-align: justify;">
- ah! sim, agora lembro.</div>
<div style="text-align: justify;">
- então, tava aqui lendo a tal sentença e tive uma ideia. Liguei para um <i>adevogado</i>, meu amigo de escritório daí!</div>
<div style="text-align: justify;">
<a name='more'></a><br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Respirei mais fundo ainda. A vontade que tive foi de bater o telefone (sim, ainda uso o fixo). Como alguém em sã consciência poderia interromper o sono do outro para ficar divagando sobre processo jurídico? No entanto, antes que o meu braço descesse (tá vendo a vantagem do fio?), me dei conta de que ela podia não estar bem. Sozinha naquele frio infernal (ops! o inferno é quente, né?). Melhor dizendo: naquele frio invernal (isso parece pleonasmo... bom, mas pra mim nascida em uma terra sem estações existe frio de primavera, frio de outono... deixa como está e voltemos ao que interessa), ela podia estar precisando de alguém para conversar e inventou a primeira coisa que lhe veio à cabeça ou, talvez, tivesse tomado uma taça de vinho a mais. </div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Recompus-me a tempo. Lembrava perfeitamente dos dias em que, de férias por lá, a acompanhei na visita ao imóvel. Lembrava também que depois da segunda visita ela me confessara que tinha perdido o interesse. Se não estou enganada falou em algo sobre a localização. Emendei a conversa.</div>
<div style="text-align: justify;">
- advogado?</div>
<div style="text-align: justify;">
- sim, ele me disse que se eu arranjasse testemunhas idôneas das minhas visitas, ele juntaria a minuta do contrato de compra/venda que eles me enviaram e...</div>
<div style="text-align: justify;">
- pelo que me recordo não foi nem assinada. Não tou entendendo direito o que você está falando.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Apelei cheia de cuidados e já quase concluindo uma teoria sobre sua saúde mental.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
- Guria, tu além de idônea continua sendo a mesma tonta de sempre. Presta atenção no que me disse o <i>adevogado</i>: se juntar o documento sem assinatura, as testemunhas da visita e o comprovante do pedágio da estrada já temos indícios fortes! E depois tu não lembras que fizemos uma selfie na varanda? lembras que usei o pau-de-selfie bem comprido para aparecer o detalhe da fachada que eu tinha gostado? (ela é mais moderna e afeita a tecnologias que eu). Então? quando mostrei a fotografia no celular com data, hora, localização, ele disse que tava ganho. Diz ele que um procurador, amigo íntimo, afirmou que era prova e não indício.</div>
<div style="text-align: justify;">
- Sei.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Àquela altura já não sabia se era o sono, apreensão sobre o estado de saúde da minha amiga ou se eu era mesmo ingênua, burra, sei lá o que. Abandonei a estratégia e fui sincera:</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
- continuo sem entender nada! enlouqueceu de vez, foi? </div>
<div style="text-align: justify;">
- Fique calma, vou explicar tudo direitinho. Preciso de você como testemunha no processo que vamos dar entrada na justiça aqui em Curitiba. O <i>adevogado</i> jura que serei declarada proprietária. E que se recorrerem para uma instância superior eu ganho é o apartamento todo montado porque a pena ao acusado de não me entregar as chaves será maior. </div>
<div style="text-align: justify;">
- que diabéisso! e o monte de defeitos que botastes na escada?</div>
<div style="text-align: justify;">
- então, amiga... nestas circunstâncias daí... até injeção na testa!</div>
<div style="text-align: justify;">
- mermã do céu, eu tou morrendo de sono. Sei que cê tá eufórica, mas deve estar bem cansadinha também. Conheço bem tua rotina de trabalho. Conversaremos amanhã. Não se preocupe, estarei sempre do teu lado. Beijos!</div>
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<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Acho que ainda ouvi lá longe o entusiamo dela quase gritando "a Lei é para todos!! Beijinhos! Tchau, querida!". Desliguei o telefone. Deitei e cadê o sono? Minha amiga linda e tão inteligente estaria louca? o tal advogado existiria? a tal sentença existiria? enlouqueceram todos? Ou fui eu que enlouqueci? Teria sonhado? O telefone realmente teria tocado?</div>
<div style="text-align: justify;">
Por via das dúvidas levantei, fiz um café, sentei à escrivaninha e escrevi este conto... em ficção tudo pode, né?</div>
</div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-69132448612945285682017-12-28T08:00:00.000-03:002018-01-07T14:24:57.242-03:002017: entre o prazer e a dor<div style="-en-clipboard: true;">
<span style="font-size: 14pt;"><br /></span></div>
<i>a máquina que o pôs em movimento é alheia a ele,<br /> às vezes alheia ao tempo em que ele vive. </i><br />
<br />
<span style="font-size: x-small;">[Abril Despedaçado, p.93 - Ismail Kadaré, tradução do albanês de Bernardo Joffily.]</span><br />
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<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
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<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
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<span style="font-size: x-small;"><br /></span></div>
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhL7QaLQLiqGKSa4CslX3tc1f7lGPnIoLRVhdtEiTRId3BCBr1vaWsx3dUK0Cpgx0PVK7Rg0zJqmQwODDvafef_2FyOyC2bMXjv0smjtCNgyPj48xwA2itnXHnwJSbQT7LzRutLDcdadjM/s1600/IMG_0037+%25283%2529.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="986" data-original-width="1600" height="393" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhL7QaLQLiqGKSa4CslX3tc1f7lGPnIoLRVhdtEiTRId3BCBr1vaWsx3dUK0Cpgx0PVK7Rg0zJqmQwODDvafef_2FyOyC2bMXjv0smjtCNgyPj48xwA2itnXHnwJSbQT7LzRutLDcdadjM/s640/IMG_0037+%25283%2529.JPG" width="640" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">flores secas, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
<br />
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<br /></div>
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Vi o filme Abril Despedaçado (2001) antes de ler o livro do albanês Ismail Kadaré. Já tinha certo apreço pelo conteúdo literário encontrado na linguagem de Walter Salles em filmes anteriores como Terra Estrangeira (1995) e Central do Brasil (1998). Possivelmente parte da alegria de sentir algo novo no cinema brasileiro que andava em baixa. Mas não conhecia Kadaré e nem sua escrita instigante. Portanto as imagens, a princípio, me foram fornecidas pela bela fotografia de Walter Carvalho. Imagens que, inexplicavelmente, encontraram eco na minha alma. Tento explicar: não se tratava apenas de ver representado na tela grande o belo extraído da natureza em luta constante contra a morte, que nos acostumamos a ver nos filmes em que o espaço nordestino é tema determinante do enredo, como Terra Seca ou Deus e o Diabo na Terra do Sol. Paisagem que toca e fala muito de perto aos que nasceram ou viveram algum tempo de suas vidas na aridez do sertão. A mudança de foco do drama social para o drama interior que antecede a escolha entre o prazer e a dor era como uma ponta de espinho cravada no pé, a cada passo uma fisgada a me dizer que estava ali. Sem outra opção, devorei o livro.</div>
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<a name='more'></a></div>
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<br /></div>
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Mais tarde, ao decidir por um projeto de pesquisa para o Mestrado em Letras, não tive dúvidas: estudaria a relação literatura e cinema tendo como base teórica a Semiótica. Para delimitar o objeto, também não restariam dúvidas: uma análise comparativa das obras de Kadaré e Walter Salles se impunha como necessidade. Como se algo mais forte que eu me empurrasse para a busca pela compreensão da interferência da geografia física (a aridez) na rigidez das normas (tradições, religiosidade, honra, austeridade, não ditos) percebida nas relações humanas do meu lugar, presenciados de forma incompreensível na infância ou absorvida das histórias sobre os antepassados e o caráter opressivo do espaço em que duelavam valores arcaicos e tentativas de rompimento. Claro que, de início, tudo era muito superficial e intuitivo. Não passava pela minha cabeça que essa escolha tinha algo a ver com a necessidade da catarse que se avizinhava.</div>
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<br /></div>
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<br />
<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: right; margin-left: 1em; text-align: right;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh6kWUsyWSRj3NsSfLNWrrrxf_rpQX33Ggv-HhFRpso2Pvi712qV_zeUN5GqZgRT5tDu13aDW4pLFfIOyuBf2a_ca9ygPdBFkwvC7MIuVG2ZBqe4f3XaV3nB24_-rSQA5ylk9wEppOiWSM/s1600/IMG_1985+%25282%2529.JPG" imageanchor="1" style="clear: right; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1200" data-original-width="1600" height="240" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh6kWUsyWSRj3NsSfLNWrrrxf_rpQX33Ggv-HhFRpso2Pvi712qV_zeUN5GqZgRT5tDu13aDW4pLFfIOyuBf2a_ca9ygPdBFkwvC7MIuVG2ZBqe4f3XaV3nB24_-rSQA5ylk9wEppOiWSM/s320/IMG_1985+%25282%2529.JPG" width="320" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><br /></td></tr>
</tbody></table>
</div>
<div style="text-align: justify;">
A pesquisa me exigiu um aprofundamento maior que o esperado, do cinema à literatura e dessa à tragédia grega. Tudo isso permeado pela complexa teoria semiótica de Peirce, pela tradução intersemiótica de Plaza, e de quebra, com a aproximação inovadora entre Peirce e Bakhtin. Quanto mais lia, mais o tema me seduzia. Como se eu precisasse esgotar a minha sede naquela fonte, embora soubesse que o poço era sem fundo. Consegui um grau de satisfação mínimo, suficiente para que desse o trabalho por concluído dentro do prazo. Se, àquela altura, me perguntassem se estava satisfeita, responderia que estava aliviada. Contudo, um enorme vazio consumia minhas entranhas.</div>
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<br /></div>
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Passados quatro anos, tempo suficiente para o devido distanciamento, um editor me sugere uma reescrita para publicação. Releio a redação final para me certificar e encontro nas entrelinhas o que busquei ao longo da vida inconscientemente: a compreensão da severidade, do ambiente familiar ou provinciano que favorece a escolha da dor transmitida por gerações. O misterioso caminho da arte me revela, nas imagens evocadas pela secura das palavras de Kadaré ou pela precisão das cores, dos olhares e do silêncio nas cenas de Salles, a trágica realidade daqueles que rodam, rodam e não saem do lugar. Como se o tempo fosse demarcado pelo espaço, e a alma aprisionada por esse tempo mítico, circular, que atrai para o centro, em que a dor se instala, o correr das vidas que nunca desabrocham. Abençoando os que se fecham para velar seus mortos e amaldiçoando os que fazem opção pelo prazer de viver.</div>
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<br /></div>
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Talvez já não haja outro caminho que não o rompimento, diz o filme em uma licença poética que o afasta de Kadaré e o aproxima de Ésquilo e de sua fé na ordem justa do mundo. Catarse, dizia Aristóteles, é função da tragédia. Suscitado o terror e a piedade, há que se purificar as emoções. E o que isso tem a ver com o nosso mundo e o ano de 2017? Tem que a piedade parece ser o que se mantém e permite olhar de fora para dentro sem rancor. Piedade, talvez seja a chave para que se encontre o tom e um narrador capaz de dar conta dessa vivência em uma aridez ampliada para muito além do sertão. Fecho a agenda de um ano difícil. Dou inicio a um novo projeto. Que venha 2018!</div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-84641826375943507752017-12-10T13:00:00.001-03:002017-12-23T14:02:34.921-03:00Demolição<br />
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<br />
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiB7gGkF17IEVW9mvByrl6UcLdBwg8dzQKqmvPXG_6RrKILNhzv8xquSlHmwyLjnKnkqhVyj-vWQ_gV9HOPCbcnXSN8loWM1iZVZlxJ3pN2aT2qY3xZAhaowLkNgwrQaPraxPUyB3uRImU/s1600/IMG_1603+%25282%2529.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="965" data-original-width="1600" height="386" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiB7gGkF17IEVW9mvByrl6UcLdBwg8dzQKqmvPXG_6RrKILNhzv8xquSlHmwyLjnKnkqhVyj-vWQ_gV9HOPCbcnXSN8loWM1iZVZlxJ3pN2aT2qY3xZAhaowLkNgwrQaPraxPUyB3uRImU/s640/IMG_1603+%25282%2529.JPG" width="640" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">adobe, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
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<br />
<span style="font-size: large;"></span><br />
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: x-large;">Das paredes o marrom do adobe escorreu cedendo à insistência das chuvas, como o sangue amarelado das mariposas. Trincas se fizeram brechas na fragilidade da arcaica estrutura revestida de austeridade, olhares severos e não ditos.</span></div>
<span style="font-size: medium;"><span style="font-size: x-large;">
</span></span>
<br />
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-size: x-large;"><br /></span></span></div>
<span style="font-size: medium;">
</span>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-size: x-large;">Já não cabiam reparos ao anúncio de inevitável rompimento. Restou no chão sobre escombros o arrastar dos passos em fuga, fatigados de peso e imobilidade. Carregando nas cicatrizes leveza e movimento.</span></span></div>
<span style="font-size: medium;">
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="font-size: x-large; text-align: justify;">
<br /></div>
</span>Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8199644441512370428.post-8710182149101813832017-11-11T20:53:00.000-03:002017-11-11T21:01:24.416-03:00Montagem do dia<br />
<br />
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg22ie4ADAxNH_zm0sjQz6v3kWkOOkdJHzP8NHWvDMxbykB4mcSbP8VKgdKIqZ_bBVWbXfRfYzHCzc_39xJAAQJMbvsRKJP-mH445b9Iyqxp3YsTfajA8xdReEMPRc9UZTUkk7qnP_UwGo/s1600/IMG_1382+%25286%2529.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1311" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg22ie4ADAxNH_zm0sjQz6v3kWkOOkdJHzP8NHWvDMxbykB4mcSbP8VKgdKIqZ_bBVWbXfRfYzHCzc_39xJAAQJMbvsRKJP-mH445b9Iyqxp3YsTfajA8xdReEMPRc9UZTUkk7qnP_UwGo/s640/IMG_1382+%25286%2529.JPG" width="524" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">assento à janela, por Sergia A.</td></tr>
</tbody></table>
<br />
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<br />
<br />
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: x-large;">Tomo posse de cantos, como herdeira do que em sonho foi meu. Planto sementes como garantia. Cedo à insistência do sol. Do ben-te-vi e do café rompendo os dias. Desperto a languidez do transe que cedo me encanta.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: x-large;">Na janela namoro uma brisa acanhada, aspirando ingenuidade. Antes que a boca do poema salte das páginas e, por inteiro, me devore.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
Sergia A.http://www.blogger.com/profile/12556933828723914847noreply@blogger.com0