domingo, 27 de setembro de 2015

Cartas da Itália: Como



Non parola orizzontale che sommerge,
ma il bianco dei margini, la pausa che
copre l’assenza tra te e me.


(Elisa biagini, in Da una crepe)


flores antes da montanha, por Sergia A.


Como, 24/09/2015


Querida L.


Alguns dias nos separam e já sinto enormemente a tua falta. Vejo-te em cada janela florida dos casarões medievais que estreitam as ruas desta cidade. Ou, nos Pinocchios que atraem meu olhar para as vitrines das pequenas lojas. Ou, ainda, nas meninas de cabelos pretos, de corte reto desalinhado pelo vento, velozes em suas bicicletas seguindo suas mamas/papas. Mas o tempo também é veloz. Logo, logo estaremos de mãos dados percorrendo livrarias. Agora é cumprir cada passo da jornada que nos distancia.

Pinocchio na janela, por Sergia A.



Por aqui, lagos e montanhas enfeitam meus dias. O outono se anuncia em chuvas finas e em uma ligeira queda de temperatura. Cubro-me de agasalhos, pois para mim a diferença é abissal. Deste início já temos motivos para rir por tardes inteiras (conheces bem o meu senso de orientação...). Mas isso não vem ao caso por enquanto, o que me leva a te escrever, além da saudade, é o fato de estar em uma fronteira. É este lugar entre mundos que me provoca e me faz estender a ti, como prometi, o incômodo que o sair de mim desperta. Eis o primeiro: o que é uma fronteira?

fronteira, por Sergia A.


Bem definidas nos teus livros de geografia. Nuanças que vão do azul profundo ao celeste beirando-se à distância, na fotografia. Cinza e nebulosas, quando vistas de perto. De contornos frágeis, me dizem os olhares vazios e iguais que, por acaso, encontram o meu. Estar aqui e agora, com o mundo em ebulição e meu país se debatendo entre avanços e retrocessos, me obriga a ficar nas estações observando tipos diversos em pleno movimento. Quanto divergimos fisica e culturalmente? Quanto do outro existe em mim? É a existência de acidentes geográficos determinante para uma cultura, uma língua? Ou, são os grupos humanos que impõem a necessidade de fazer deles os limites? Não são essas linhas lugares de encontro? Como isso se reflete no modelo, ou reflete o modelo, que nos torna tão desiguais? 


L., minha linda, talvez não devas levar a sério as bobagens que escrevo. São apenas pensamentos fluidos encontrando forma na rigidez das palavras. Se submergem ou flutuam na superficie, não cabe a mim intervir na rebeldia que as torna autônomas. Não devo ser um bom exemplo de avó, certamente. Mas, acho que isso me vem por desejar para a tua geração um mundo melhor. E para ti, neste instante, o melhor do mundo que temos.

Beijos, tua
S.

4 comentários:

  1. o homem em guerra se apossou do mundo chegaram as fronteiras cada um em cada qual é assim descaminho a humanidade adorei seu texto sempre umas delícias são como balanço na rede pra sonhar

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