quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

O ritual

 
Luz angelical,  por Sergia A.


Em delírio elas dançam. Seu rodopio alucina. Desconfio que elas gostam de me provocar. Sentem prazer em me ver assim tonta, perdendo o fôlego para acompanhar de longe seu ritmo. Por compaixão, às vezes me chamam pra dançar. Eu deslizo no amplo salão. Às vezes acerto o passo. Às vezes vou ao chão. Sigo. É o dançar que me desperta o gosto, talvez mais que a dança que dali resulta.

Estou novamente às vésperas de um janeiro a observá-las, desejando ardentemente que me chamem para dançar. Há um ritual de transição a minha espera. Elas se negam, brincam comigo. Montam um jogo de sedução. Pra corresponder à altura recorro aos poetas, perfeitos bailarinos, perfeitos coreógrafos. Captam a essência do seu jogo. Tomam-nas pela mão dispondo-as em fino arranjo, ou talvez, em um gesto de resignação, se deixam domar.

Um deles vem até mim. Diante de mim, ele as dispõe em bela forma. Sobre mim, sua poesia se derrama. Nela encontro um difícil treino, que aquece meus músculos e me prepara para uma possível dança. Quem sabe, assim, surge um jeito de desejar um novo tempo. Um tempo domado pela força e leveza de duas grandes bailarinas, aqui coreografadas e conduzidas pelo poeta americano e.e. cummings: amor e sim. Os lugares e os mundos virão, inevitavelmente, por consequência:

 
love is a place

love is a place
& through this place of
love move
(with brightness of peace)
all places

yes is a world
& in this world of
yes live
(skillfully curled)
all worlds

(e.e. cummings in Complete Poems 1904-1962)


***

amor é um lugar

amor é um lugar
& por este lugar de
amor move-se
(com o esplendor da paz)
todos lugares

sim é um mundo
& nesse mundo de
sim vive
(habilmente envoltos)
todos os mundos

(Tradução de Sergia A.)

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