terça-feira, 6 de março de 2012

Do Laboratório: Gotas Cristalinas


E já se foi o sétimo mês do primeiro ano da segunda parte. Tempo de recomeço, quando sentimentos se misturam enquanto as experiências continuam fervilhando no laboratório ou na lembrança.



E Deus falou para Noé e seus filhos com ele, dizendo:
"...Este será o sinal da aliança que estou fazendo entre mim e vós
e todo ser vivente que está convosco, por todas as gerações.
"Meu arco-íris pus na nuvem ... Quando o arco-íris puder ser visto nas nuvens,
vou lembrar minha aliança ...
Nunca mais as águas se tornarão em dilúvio para destruir toda carne. "
(Gênesis 9:8-15)




Janela para o arco-íris,  por Sergia A.



De vez em quando um arco-íris invade minha janela. Nessas ocasiões faço questão de esquecer o fenômeno físico da refração da luz. Gosto de pensá-los como sinais. Pura bobagem de quem ainda se dá ao luxo de olhar para o céu. Desta vez o seu espectro colorido me transportou pelos labirintos da primeira parte. Sinais?

Quando suas portas se abriram para mim, vivíamos ainda um tempo nebuloso. Sob o comando de um General que preferia o cheiro de cavalo ao cheiro do povo, a ditadura agonizava propondo uma abertura lenta e gradual. Beneficiados pela lei de anistia os exilados estavam de volta levando às universidades, aos sindicatos e às ruas o toque de despertar. Timidamente voltávamos a ter o direito ao sonho democrático. O Banco como produto dessa sociedade reproduzia esse mundo conflituoso, de normas rígidas e pessoas dispostas a transgredi-las. Entretanto, as transformações seguiam os passos lentos e graduais da cavalaria que ainda dispunha de mãos de ferro. Manter-se vivo, depois do dilúvio, significava fazer alianças.

Conjugar o verbo aliar sempre foi, e acho que continua sendo, para mim um grande desafio. Tenho dificuldade de abrir mão do meu jeito de ver o mundo, o que não se compatibiliza com a necessidade de fazer concessões imposta pelas alianças. Talvez por isso muitas vezes segui à margem. Atrás de um escudo gostava de pensar que estava preservando minha capacidade de indignar-me com o que feria meus princípios. Não me interessavam as posições mantidas por acordos escusos. Meu direito ao trabalho vinha da minha capacidade intelectual garantida em um concurso público e no exercício diário das minhas tarefas. Adorava essa autonomia. O tempo passou e o mundo deu suas voltas. Instala-se, democraticamente, um comando descalço exalando cheiro de povo. Manter-se vivo, depois do dilúvio, significa fazer alianças.

O exercício da democracia parece ser, para os que aprenderam a fazer alianças, ainda problemático. Acreditam eles, muitas vezes, que suas alianças são mais poderosas que o apelo democrático da igualdade de oportunidades e respeito ao que é público. Gosto de pensar que estou a serviço de todos e que ainda tenho capacidade de indignar-me com o que meu jogo de cintura não alcança. Adoro a autonomia do concurso público que me garantiu trinta anos de sobrevivência em um tempo que se deslocou de uma ditadura a um regime democrático em consolidação. Hoje vejo no fim do arco-íris sinais de que esse regime se aperfeiçoará pela transparência que os avanços tecnológicos começam a impor. Manter-se vivo, depois do dilúvio, significará fazer alianças. Sim fazer aliança, mas composta de luz refratada por gotas cristalinas. Quem sabe na segunda parte aprendo a conjugar com tranquilidade o verbo aliar.

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