domingo, 15 de novembro de 2015

A cadeira vazia




E virá a companhia inglesa e por sua vez comprará tudo
e por sua vez perderá tudo e tudo volverá a nada
e secado o ouro escorrerá ferro, e secos morros de ferro 
taparão o vale sinistro onde não mais haverá privilégios,

(Carlos Drummond de Andrade, in Os urubus  no telhado, Claro Enigma p.97)




olhos nos olhos um minuto, por Sergia A.



O telefone toca. Entre soluços e sotaques ouço um sussurro no amanhecer:

se por aí o rio já não é doce e a lama reveste vidas e vales...
se por aqui a arrogância ver o outro como menor e não merecedor...
se a reação é violenta e a resposta é a guerra...
o que nos resta?

Inspiro. Sinto o pulmão se avolumar. Um raio de sol encontra espaço entre as persianas. Espio. Seu caminho corta o infinito azul. Expiro. Uma voz pausada toma posse de mim:

há o pensamento...
há o humano como parte da natureza...
há a descoberta da inutilidade das guerras...
há o reconhecimento de que a linha que dividia mundos se apagou...
há a certeza de um destino comum: cego para a cor da pele,  surdo para o que acentua a sonoridade das línguas... insensível ao  ouro e aos diamantes que alimentaram a arrogância, ou ao ferro remanescente...
há uma cadeira vazia à espera de um encontro...
há a urgência por uma nova ordem em que, libertos e destemidos, olhares possam se doar por um instante.

O despertador toca. Levanto de um salto. Há uma página em branco sobre a tela.


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