sábado, 2 de junho de 2012

Quando o futuro é apenas um caminho não trilhado


To die by your side (2011), by Spike Jonze e Simon Cahn
Fonte: YouTube


Anoitece. Uma livraria cerra suas portas. As personagens dos livros ganham vida. Tudo pode acontecer... inclusive um intrigante mergulho em William Faulkner.

Completamente por acaso, em uma das minhas peregrinações por sites interessantes (e são tantos... amo essa liberdade proporcionada pela tecnologia) encontrei um comentário sobre o curta To die by your side (2011), dirigido por Spike Jonze e Simon Cahn. Curiosa, devorei avidamente os seus seis minutos de diálogo intenso com clássicos da literatura de língua inglesa, e mais alguns minutos do making of, para compreender que além da homenagem explícita à Literatura o filme pode ser entendido como uma metáfora do processo de criação da arte contemporânea.

Utilizando a técnica de stop-motion, a animação é feita a partir da delicadeza das figuras recortadas que caracteriza a arte em bordado (tipo aplicação em feltro) da estilista e designer francesa Olympia Le Tan, co-responsável pelo roteiro. São do seu ateliê as bolsas de mão em formato de livros que reproduzem capas de clássicos. Daí a idéia original do filme que se amplia para representar uma tragicômica história de amor. Na mente dos espectadores pode surgir de repente uma questão: por que todas as personagens (o esqueleto de Macbeth, Mina Harker de Drácula, a terrível baleia branca Moby Dick) mergulham no livro de Faulkner? Mergulhei...

Pois é, mergulhar em Faulkner é sem dúvida encontrar Macbeth (de onde vem o título do seu célebre romance O Som e a Fúria?  [1]). Ele próprio afirmava não sair de casa sem Shakespeare no bolso. Ou, mergulhar em Faulkner (admirador confesso de Melville) pode ser encontrar a obsessão de Ahab por um acontecimento passado que destrói qualquer possibilidade de futuro de todos a seu redor, no enfrentamento de Moby Dick. Ou, quem sabe, mergulhar em Faulkner seria encontrar uma personagem feminina forte e determinada como Mina Harker, que mesmo sendo vítima de Drácula consegue fugir e articular toda a inteligência para combatê-lo. Tia Jenny, personagem de Sartoris (1929), é a articuladora da permanência do passado no presente. É pela sua voz que se mantém de pé a história da família e de uma sociedade em decadência com a qual os personagens masculinos não conseguem lidar.


Mas, talvez, mergulhar em Faulkner seja, ainda, encontrar personagens sem futuro, perdidos em um tempo presente que retorna ao passado infinitamente. Talvez seja descobrir que o futuro não existe, é O caminho não trilhado do destino de um homem (in Sartoris p. 104), e daí apenas a morte como redenção. Constrói-se, então um sentido para o filme cujos personagens carregando o peso de suas histórias encontram a morte que os liberta e ironicamente permite a felicidade do instante. Como diria o estudioso da narrativa fílmica David Bordwell, um sentido que só é possível na mente do espectador que complementa essa montagem de vozes a partir da sua própria vivência. Esse é o processo criativo do cinema, o grande representante da arte contemporânea, parece nos dizer o pequeno filme em sua rapidez e intensidade. Uma arte que reproduz e reflete um mundo de informação, conhecimento e velocidade.

(Resumo de comunicação levada ao II Simpósio do Curso de Letras/Inglês da UESPI, em 29/05/2012)

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[1] “A vida é uma história contada por um idiota, cheia de som e fúria, sem significado nenhum”. (It (life) is a tale / Told by an idiot, full of sound and fury, signifying nothing. – Cena V Ato V de Macbeth/Shakespeare).

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