quinta-feira, 5 de junho de 2014

Verde-amarelo utópico



Hey you

Don´t tell me there´s no hope at all
Together we stand, divided we fall.

(Roger Waters in Hey You)



janela para junho, por Sergia A.


Se eu fosse o poeta diria que a tarde estava competente para o mergulho das andorinhas. Sobre cores, a leveza do vento a dissolver nuvens e a balançar tímidas bandeirolas. No entanto, junho, que sempre me pareceu risonho, deu pra se anunciar assim carregado de incertezas. As manchetes semeiam o medo em letras garrafais. Há um túnel, dizem os comentaristas políticos de plantão. Dele poderão sair borboletas esvoaçantes ou a carga pesada de um trem. Tudo isso enquanto permito que o entusiasta que mora em mim pinte de verde-amarelo minha janela. 

Aqui na minha janela verde-amarela, pássaros me visitam trazendo no bico mais que ramos secos para os ninhos. Parecem assustados com o barulho do descarrilhar de comboios. Desencantados  indagam: a quem interessa o caos? No discurso dos historiadores, a violência é parto de grandes transformações. Dor necessária. Se assim for, desconfio que aprendemos pouco dessa imensa jornada. Amedronta-me o abalo da fé nos avanços científicos que humanizam antigos meios de dar à luz. 

Aqui da minha janela verde-amarela, olho para cima e para os lados e para o chão. Avisto o ranço de velhos protagonistas fechando a porteira de seus quintais. Avisto, por cima da cordilheira, o vizinho renovar-se ao encher de juventude seus palcos de decisões. Avisto, sob o tapete, resquícios da farra de ontem aguardando braços fortes e corajosos. Avisto, no voo livre dos pássaros, asas delicadas que se fortalecem no exercício do adejo diário. Aquele, que se faz de peito nu, olhos bem abertos, com humildade e consciência corporal. Membro por membro se interligando ao todo em movimento. 

Aqui na minha janela verde-amarela, solos de guitarra se misturam ao batuque de pandeiros e tamborins preenchendo de tons violetas o dia que se vai. E amanhã, quando a rede balançar nos campos de futebol, meu coração leviano impulsionará um grito entorpecido de desejo e fé. Pois meu corpo, já sem paciência para sofrimentos e lamúrias, deu pra sonhar, com frequência, com parto sem dor.



 



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