quinta-feira, 28 de julho de 2011

Por uma Vida Significativa

"No fundo, a vida não passa
de uma constante tensão entre acaso e necessidade.”
Ferreira Gullar
                              

A palavra não foi feita para ser solitária, dizia o texto de autoria desconhecida que recebi de uma amiga. Um poderoso argumento para explicar a nossa necessidade de significação e o quanto tal significado ganha força quando nos permitimos ser complementados pelo outro. Como no poema cujo encantamento reside na forma como palavras soltas saem do dicionário e se agrupam para ganhar asas na imagem poética criada. Ao ler o texto não pude evitar que me viesse à mente o cultuado filme Revolutionary Road – 2008 (Foi Apenas um Sonho, na tradução brasileira), do cineasta britânico Sam Mendes, cujas personagens centrais – o Sr. e a Sra. Wheeler - se perdem nesta busca pelo sentido da vida.



A fonte inspiradora do filme foi o livro homônimo de Richards Yates (1927-1992) que de forma realista (ou pessimista como querem alguns) traça um retrato dos anos cinqüenta nos Estados Unidos, quando o “sonho americano” se instala trazendo aos subúrbios (onde vive o casal) o forte desejo de conformidade: uma boa casa, um carro e filhos saudáveis ainda que mantidos por um trabalho medíocre. Uma espécie de cegueira e de busca pela segurança a qualquer preço, enterrando em terreno estéril a semente de uma vida com significado especial. Yates disse certa vez em uma entrevista que o título “Revolutionary Road” – o nome da rua do subúrbio onde vivem Frank e April, seria uma metáfora aos rumos que os ideais da independência americana seguiram, encontrando seu fim em uma limpa rua arborizada de um subúrbio qualquer de uma grande cidade na década de 1950. Lançado em 1961, o livro provoca em seus leitores certa inquietação, a angústia necessária para desestabilizar o que hoje administradores e psicólogos chamam “zona de conforto”. Sem dúvida, tal inquietação, não apenas a provocada pelo livro, mas aquela que se tornaria coletiva durante toda uma década e levaria uma geração inteira a se perguntar qual o sentido da vida, revolucionou costumes deixando para as gerações seguintes um poderoso legado.

No filme a desintegração do sonho de uma vida significativa é acompanhada, ou tem origem, pela completa desarticulação do casal. Mais que no amor, a união se fundamentava no sonho comum, na admiração que o desejo de fugir de uma vida confortavelmente morna despertava no outro. Na medida em que o sonho se individualiza, e o estar juntos caminha para a sufocadora mesmice da estabilidade, a poesia se perde para sempre. Frank e April tornam-se palavras soltas cujos sentidos estão estagnados em dicionários nas estantes pouco freqüentadas. O acaso, muitas vezes revelador da sensibilidade extra que nos faz perseguir a realização de algo especial não acontece, deixando prevalecer a necessidade que nesse caso não se faz suficientemente forte e capaz de curar a cegueira. O fim desenhado para o filme realça a profundidade do trágico comodismo, provocando nos expectadores a angústia reflexiva que extrapola o questionamento individual sobre o sentido da vida. Talvez apontando para a angústia coletiva que vive neste momento o povo americano ao ver o seu sonho se desintegrando diante de uma economia que não mais suporta o estilo consumista e individualista de ser, nem tampouco permite que se mantenha a arrogante posição unilateral no seu relacionamento com o mundo.

Encontrar uma saída para a angústia da não significação, individual ou coletiva, talvez passe pelo mesmo processo da palavra que para ser carregada de sentido precisa perder sua condição estagnada, confortável e solitária de dicionário para encontrar no outro a plenitude solidária, se não por acaso mas por necessidade.

( fev/2011 )

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