segunda-feira, 25 de julho de 2011

Sobre o Prazer de Celebrar o Amor


“"Viver é decifrar enigmas”
(Ariano Suassuna in O Romance d’A Pedra do Reino)        

         
Foto: Cândido Neto


Há um ano, quando minha filha me confidenciou o desejo de fazer do seu casamento uma grande festa muitas coisas me passaram pela cabeça. Entre elas a firme convicção de que uma festa assim seria um desperdício considerando a sua natureza tão efêmera. E de que talvez o esforço para realizá-la fosse melhor aproveitado investindo-se em uma bela viagem pelo caráter duradouro das mudanças que provoca. Do alto das minhas certezas não conseguia vislumbrar o quão prazeroso seria mergulhar no grande enigma das celebrações, e quão valioso é ter motivos para celebrar.

Dava-se início, então, a uma jornada de infinitas surpresas. A primeira delas o reencontro com um velho amigo de origem germânica. Com ele aprendi que a língua alemã, em sua complexa estrutura, tem uma palavra composta para descrever a cerimônia de casamento: “hochzeit”, que agrupa dois termos carregados de significados, hoch=elevado e zeit=tempo. Despediu-se desejando que nós tivéssemos muito prazer na tarefa de preparação. Só mais tarde compreendi a grandiosidade desse recado, ao perceber ser esse um tempo que se eleva por ser um tempo de pequenos acontecimentos diários que nos obrigam ao contato constante. Discutir detalhes em horas de conversas ou troca freqüente de mensagens eletrônicas, tomar decisões compartilhadas sobre a cor da decoração, o papel do convite, o tipo de cerimônia, o local. O que à primeira vista pode parecer futilidade torna-se um grande aprendizado sobre o respeito e a tolerância, o saber ouvir a voz do outro, o saber dizer o contraditório, administrar pequenos conflitos, transformando-se em um grande exercício do diálogo que resgata a convivência entre as pessoas e ajuda a fortalecer relacionamentos.

Detalhes que parecem pequenos e fáceis de serem resolvidos tomam proporções gigantescas e vão dando a dimensão do que é realizar sonhos. É assim que a escolha do espumante deixa de ser uma questão de fornecedor ou de preço para tornar-se motivo da reunião de amigos, de pesquisa e aprendizado sobre o seu processo de fabricação, revelando o prazer das pequenas descobertas. É assim que a lista de convidados, limitada pelo tamanho do bolso, deixa de ser uma simples relação de nomes nos conduzindo a uma reflexão sobre a importância das pessoas em nossa vida. Quando se foge da mediocridade de ver essa oportunidade como a chance de manter uma rede de contatos e define-se como critério de seleção a proximidade, a relação de afetividade, cada nome da lista vem acompanhado de boas lembranças, de rostos acolhedores, de histórias de vida e de vidas que fizeram parte da nossa história. É assim que a intenção de relaxar, na noite anterior ao evento, se transforma em uma oportunidade ímpar de abrir a garrafa de um vinho especial para estimular uma conversa animada entre mulheres de três gerações com tão poucas oportunidades de se perceberem sem a marca do tempo e sem o peso das máscaras de avó-mãe-filha.

A duração da cerimônia e da festa, como que a desafiar minha tola ignorância, ultrapassa as medidas previamente definidas. O poder de transformar extrapola o individual proporcionado pelas viagens e atinge o coletivo. A alegria de ver o que um dia foi apenas imaginação, materializado e cumprindo a sua função de emocionar pela beleza é certamente imensurável. Como imensurável é a alegria de sentir a presença de amigos, de perceber que as pessoas não apenas atenderam ao seu chamado mas prepararam o espírito para viver aquele momento. Como imensurável é o prazer de ser contagiado pela energia do encontro. Como imensurável é o crescimento advindo do mistério dos sonhos que se realizam. Como imensurável é sentir a vibração da celebração do amor que retira nossa existência de sua natural pequenez para enriquecê-la de sentido.

Hoje, gratificada, com uma voz encantadora ainda ressoando no ouvido o refrão “Valeu à pena êh...êh...valeu à pena... êh...êh...sou pescador de ilusões...” e sentindo no peito a saudade gostosa que só visita o coração de quem ousa viver, entendo que efêmera, afinal, é a vida. Desvendar os seus enigmas no tempo que nos é dado é intensificá-la ao ponto de parecer eterna.

Teresina, 14.11.2010

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