terça-feira, 6 de setembro de 2011

Da série O Laboratório: O Tempo e o Movimento


Pois é certo que o vivido
- na alegria ou desespero -
como o gás é consumido...
Recomeçamos de zero.[1]

Neste 06 de setembro, uma comemoração: o primeiro mês do primeiro ano da segunda parte se foi. Não pude fugir das lembranças da primeira parte.

Hoje uma vontade irresistível de escrever me acordou mais cedo. Há algum tempo não despertava assim, com esta urgência. Alguns fatos passados e bem presentes precipitaram o desejo. Na mente uma imagem persistente: um banco de Igreja onde os seis rendem homenagem ao sétimo que agora se afasta. Lágrimas em cada olhar contrastam visivelmente com o sorriso da fotografia estendida ao pé do altar.

Sabiamente, a memória guarda os bons momentos para nos acalentar quando tudo se distancia. Setembro de 1987: criava-se na CAIXA a Divisão de Engenharia, para fazer frente aos novos desafios advindos da incorporação do BNH. Sob o comando de uma mulher destemida, lá estavam eles adaptando-se à cultura da nova empresa. Entre pensamentos lógicos e racionais, eu tentava, com o pouco que sabia e da forma que conseguia, manter a organização. A linguagem técnica de engenharia me era familiar, o que facilitava a ordenação dos inúmeros laudos, pareceres e análises que as teclas ritmadas da máquina de datilografia registravam ao longo dos dias. Em meio a divisórias cinzas e mobiliário de jacarandá formávamos um pequeno grupo com a missão de fornecer apoio técnico aos negócios e à manutenção do patrimônio da instituição. Brotava ali a semente do que viria a ser, duas décadas depois, o terceiro pé da gigantesca empresa. Brotava ali a lição de respeito e confiança que o cotidiano alimentava.

O tempo habilmente conduzia o movimento do grupo que tomava formas e rumos diversos, de acordo com as oscilações da direção central. Novos braços, novos rostos aos poucos ampliavam a produção e a responsabilidade amparados em estruturas que se montavam e desmontavam ao sabor das ondas inovadoras da administração. Ora tínhamos o status de representação regional, ora não passávamos de uma equipe vinculada a um outro poder estabelecido enquanto dormíamos. O tempo habilmente também conduzia o movimento interior das pessoas. O vai-e-vem dos modelos organizacionais nos oferecia a oportunidade de descobrir que nada somos além daquilo que nos torna humanos: o sentimento. Castelos se desmoronavam da mesma forma que se montavam, e das suas cinzas outros se edificavam em movimentos cíclicos, como cíclicos são os fenômenos da natureza. Restava-nos o aprendizado e a consciência do poder da escolha. Aprendia-se que bons e maus momentos são naturais como naturais são as montanhas e os vales, o dia e a noite, e que a realização de sonhos está diretamente relacionada ao risco da escolha. Em nome dela, já com filhos crescidos, fui impulsionada a retornar aos bancos da faculdade para atender um chamado interior, uma voz que há tempos pedia a atitude de buscar o treino para desenvolver um dom natural. Da mesma forma, seguindo cada um a sua escolha, outros caminhos foram buscados individualmente em novos movimentos delineados habilmente pelo tempo.

Na imagem da Igreja, o tempo presente parece nos oferecer um novo movimento diante do qual choramos por não querer entendê-lo como natural. Um ciclo se fecha, como a noite finda o dia que foi belo ao amanhecer. No entanto, o brilho do dia assim como o sentimento de que somos essencialmente feitos não se dissolve na escuridão da noite.

Aprendizes do tempo, precisamos agora compreender uma nova lição que exige de nós olhos capazes de enxergar o brilho na sombra que passa.

(Escrito em 22/05/2008)
________________________________________ 
[1] Ferreira Gullar. Toada à Toa in Em alguma parte alguma

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigada pela visita! Volte sempre.